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Cronologia Sindical

A organização dos trabalhadores brasileiros no início do século 20 teve participação fundamental dos imigrantes, principalmente italianos e espanhóis

Paulo Rogério Leite de Andrade (Coordenador do Departamento de Comunicação do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região)

A organização dos trabalhadores brasileiros no início do século 20 teve participação fundamental dos imigrantes, principalmente italianos e espanhóis.

Com o fim da escravidão – oficializado em 1888 – governo e fazendeiros do Brasil fizeram intensa campanha no exterior prometendo grande oferta de trabalho, bons salários e oportunidades de aquisição de terras para o estrangeiro que viesse ao país. Estima-se que entre 1870 e 1900 mais de 800 mil imigrantes ingressaram no país, sendo que 580 mil vieram do sul da Itália para as regiões cafeeiras do Centro-Sul.

Poucos estrangeiros conseguiram a prometida terra. As famílias desses trabalhadores cresciam enquanto o custo de vida aumentava e as perspectivas de melhores oportunidades, diminuíam.

No final do século 19, muitos imigrantes deixaram o campo para tentar a sorte nas indústrias que começavam a despontar no Brasil, embora a economia ainda fosse fortemente baseada em produtos agrícolas para exportação, como o algodão, o açúcar, o cacau e, em especial, o café.

A industrialização do Brasil estava cerca de 150 anos atrasada em relação à Europa e aos Estados Unidos, onde os operários já contavam com sindicatos para representar suas reivindicações e organizar suas lutas. Desde 1864 os trabalhadores dos EUA e da Europa já se reuniam inclusive em uma entidade internacional, a AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores).

Enquanto os operários europeus se contavam aos milhões. No Brasil, havia pouco mais de 50 mil trabalhadores em indústrias no início do século 20; sendo cerca de 90% estrangeiros.

Com a experiência de seus países de origem, os imigrantes estimularam e lideraram uniões entre trabalhadores para lutar por melhores salários, condições de trabalho e de vida e também por mudanças sociais mais radicais, baseadas em uma revolução popular.

A orientação político-sindical desses primeiros líderes sindicais brasileiros – principalmente italianos – era o anarquismo.

Havia também, em menor número, lideranças inspiradas nas teorias comunistas ou socialistas. Tanto anarquistas quanto comunistas também se declaravam socialistas, pois tinham como bandeira de atuação a justiça social.

Já a tendência que se declarava simplesmente socialista nos primeiros anos do século era na verdade ligada à social-democracia européia, que durante a primeira guerra passou a apoiar a burguesia de seus respectivos países. A influência desses socialistas brasileiros entre os operários, que já era pequena nos anos anteriores, diminuiu ainda mais após 1914. Os social-democratas se contentavam em obter apenas “reformas pontuais no sistema”. Por isso são chamados também de reformistas. A atitude “reformista” foi assimilada e ampliada pouco depois por outro grupo de militantes sindicais, chamados de trabalhistas ou “amarelos”, que passaram a defender também uma postura de “colaboração” dos sindicatos com o poder político vigente.

Nessa época surge também o grupo dos católicos, que segue basicamente as mesmas diretrizes dos trabalhistas, diferenciando-se apenas pelo destaque dado à religiosidade de seus adeptos. Logo em seguida, após a revolução russa de 1917, os comunistas brasileiros, a exemplo de outras partes do mundo, começaram a ganhar impulso considerável, crescendo em número de simpatizantes e em atuação política.

Também a classe dominante tinha seus conflitos, embora sem deixar de se unir na defesa desse domínio. Os governantes e patrões se dividiam em debates sobre o modelo social, político e econômico que pretendiam para o país. Sem entrar em choque direto entre elas, havia tendências defensoras do conservadorismo, do autoritarismo, do liberalismo, etc.

A elite também tinha seus dilemas sobre como tratar os trabalhadores livres. Alguns se recusavam a abandonar o método escravocrata. Outros defendiam concessões que pudessem seduzir o trabalhador ou afastá-lo de manifestações e organizações sindicais.

Essas foram as bases das primeiras organizações de trabalhadores e das relações capital-trabalho no século 20.

Motivos das primeiras greves do século

Melhores Salários
Contra atraso nos pagamentos
Por melhores condições de trabalho
Jornada de 8 horas (a jornada nas indústrias era de 14 a 16 horas por dia)
Proteção aos menores e às mulheres (ambos trabalhavam igual ao adulto e recebiam metade do salário)
Contra demissões e perseguições de chefia
Pelo cumprimento de acordos
Contra a carestia (custo de vida)
Contra a repressão aos trabalhadores

CRONOLOGIA

1901 – O 1º de maio é comemorado pela primeira vez no Brasil como um dia de homenagens às lutas e à conscientização dos trabalhadores. Também pela primeira vez há um ato em praça pública pelo Dia do Trabalhador, no Rio de Janeiro. Já em Campinas-SP, a data foi marcada pelo lançamento do jornal “A Voz Operária”. Nesse ano, atrasos no pagamento causaram greves de tecelões e de chapeleiros em São Paulo. Já no Rio de Janeiro, tecelões cruzaram os braços para protestar contra maus tratos nas fábricas.

Em Sorocaba – A categoria metalúrgica em Sorocaba era inexpressiva. A principal empresa do ramo, a Real Fábrica de Ferro, no morro de Ipanema, havia fechado em 1895. As indústrias mais significativas da cidade eram do setor têxtil, como a Nossa Senhora da Ponte, a Santa Rosália e a Votorantim, inauguradas na penúltima década do século anterior. Outra categoria importante era dos ferroviários da Sorocabana, que em julho desse ano entrou em greve porque estavam sem pagamento havia 4 meses. Os trabalhadores arrancaram trilhos e cortaram fios de telégrafo em protesto contra os atrasos.

1902 – Grupos de imigrantes denunciam ao Comissariado Italiano, em São Paulo, que são tratados como escravos em fazendas do interior paulista. Os trabalhadores são expostos a ritmo e jornada de trabalho abusivos e há casos de violência típica do escravagismo. Os lavradores também reclamam por serem obrigados a comprar seus mantimentos nas vendas dos fazendeiros, o que os tornava permanentemente endividados, pois a conta no final do mês quase sempre era maior do que o salário recebido.

1903 – Cerca de 25 mil trabalhadores do Rio de Janeiro, então Capital Federal, participam de movimentos reivindicatórios durante o ano. Além de aumento salarial e redução de jornada, várias manifestações exigem melhores condições de vida. Os operários vivem com suas famílias em pardieiros, cortiços ou, no máximo, pensões. A moradia digna é um sonho inatingível para o assalariado.

1904 – Funcionários públicos do Rio de Janeiro entram em greve. Os salários estavam atrasados há sete meses. No Ceará, é a Marinha Mercante que entra em greve por aumento do soldo e pelo fim dos castigos, como as chibatadas. Os marinheiros são presos e deportados para os seringais do Acre, prática que seria oficializada pela Lei Adolfo Gordo, em 1907. Os protestos dos marinheiros não se encerraram com as prisões. Em 1910 aconteceu a Revolta da Chibata, no Rio de Janeiro, com adesão de 2379 homens da Marinha, que exigiam o fim dos castigos corporais.

1905 – Trabalhadores têxteis de Sorocaba param para exigir aumento salarial. No final do ano estoura uma greve geral em Santos. É a primeira paralisação desse gênero no Brasil. Antes, as greves eram somente por fábrica ou, no máximo, por categoria profissional.

1906 – Acontece, em abril, no Rio de Janeiro, o 1º Congresso Operário Brasileiro. O evento foi organizado por anarco-sindicalistas, que não consideram legítimos os congressos operários de 1892 e 1902, comandados por socialistas ou “reformistas”. O congresso de 1906 aprova a criação da Confederação Operária Brasileira, a COB; a primeira central sindical do país, que foi efetivamente implantada em 1908.

1907 – É promulgada, em janeiro, a Lei Adolfo Gordo, que leva o nome do deputado que a criou. A nova lei prevê que as organizações operárias sejam reprimidas pela polícia, concede prêmios aos delatores, permite a expulsão de operários estrangeiros e condena os “agitadores” brasileiros a serem exilados nos seringais do Acre. Não há necessidade de processo para aplicar a lei. Basta a acusação patronal. Nos anos que se seguiram, centenas de trabalhadores estrangeiros foram expulsos do país por sua militância sindical.

Em 1º de maio, várias categorias profissionais de São Paulo cruzam os braços para reivindicar a jornada diária de oito horas de trabalho. Em poucos dias, o movimento ganha dimensões de greve geral se estende para o interior do estado, chegando a Ribeirão Preto, São Roque, Salto e Itu. Com o crescimento da greve, os patrões concordam em iniciar negociações e atendem às exigências dos trabalhadores da maioria das empresas. A paralisação termina no dia 24 de maio. Poucas semanas depois, associações e sindicatos denunciam que as empresas não estavam cumprindo o acordo.

Imprensa Sindical

Junto com o movimento sindical, crescia também a imprensa operária. Já na primeira década do século, os trabalhadores já a contavam com publicações expressivas como “A Plebe”, “La Bataglia”, “A Voz do Trabalhador”, “Novo Rumo”, entre outras. O conteúdo dos jornais e boletins era basicamente político a agitativo, mas também havia espaço para divulgação de eventos culturais e obras literárias, em geral com críticas ao modelo social vigente.

1908 – Em 28 de junho, aporta em Santos o navio Kasatu Maru, trazendo os primeiros 781 imigrantes japoneses ao Brasil. O destino desses trabalhadores são as lavouras de café do Oeste Paulista.

Ainda em 1908, os trabalhadores das Docas de Santos cruzam os braços para exigir redução de jornada, que era de até 18 horas por dia. A paralisação foi reprimida pela polícia. O governo enviou navios de guerra para combater os grevistas. Houve mortos e feridos.

Características do anarquismo

A orientação sindical que predominava nas primeiras décadas deste século era o anarquismo, baseado na filosofia social de Bakunin e Proudhon e difundido no Brasil pelos imigrantes europeus. As características gerais da ideologia eram:

– anti-capitalismo, pelo fim da propriedade privada e das classes sociais

– sociedade sem Estado, propõe um regime libertário, sem governo e governantes. A liberdade individual daria forma a uma nova sociedade quando a antiga ordem estivesse complentamente destruída.

– pela ação direta. Na visão anarquista, partidos políticos e parlamento não resolvem. A única luta que importa é a luta direta, o enfrentamento liderado pelo movimento sindical

– pela sociedade internacionalista. Para o anarquismo, “Operário não tem pátria”.

Os defensores do anarquismo no Brasil se dividiam em duas correntes: anarquistas e anarco-sindicalistas, com predomínio desses últimos. Os anarquistas brasileiros acreditavam que o proletariado faria uma revolução espontânea, baseada no seu grau de informação e de insatisfação. Já os anarco-sindicalistas pregavam que os trabalhadores deveriam ser educados, preparados, organizados e experimentados na luta cotidiana contra a burguesia antes de partir para a revolução. Como o próprio nome indica, essa corrente via no movimento sindical o instrumento mais significativo de transformação social. Ambos os grupos de autodenominavam libertários e contavam com uma grande greve geral que seria o caminho ou o “atalho” para a revolução do proletariado.

1909 – “Carestia, desemprego, exploração desabusada dos empregados pelos patrões, jornadas desumanas de trabalho, violência de encarregados, falta de moradia, existência miserável nas favelas e cortiços, baixos salários, febre amarela e mortalidade infantil”, são os problemas enfrentados pelos trabalhadores, noticiados pela imprensa e denunciados em greves e manifestações durante o ano. Por esses motivos, a Espanha corta os subsídios à emigração de espanhóis ao Brasil.

Apesar desses fatos, o governo, a polícia e a maior parte da imprensa alegam que não há motivo para agitação no Brasil porque se trata de um país novo, com oportunidade para todos. De acordo com esses segmentos, os conflitos sociais são provocados de palavras de ordem (do meio operário) importadas da Europa.

1911 – Trabalhadores da construção civil e têxteis de Sorocaba entram em greve pela redução da jornada. Os comerciários que participavam das Ligas Operárias, de tendência anarquista, fecham o comércio em apoio à greve. A vitória vem depois de 15 dias de paralisação.

1912 – O deputado Mário Hermes, filho do presidente marechal Hermes da Fonseca, organiza um congresso operário para se contrapor ao movimento sindical combativo. Foi a primeira tentativa do governo de manipular o movimento operário. As principais resoluções do encontro, realizado em novembro, no Rio de Janeiro, são: criação de um partido político, a Confederação Brasileira do Trabalho (CBT), que nunca chegou a funcionar; colaboração dos sindicalistas com o governo e transformação dos sindicatos em órgão de assistência social, sem caráter de luta.

Poucos sindicatos importantes se animaram a participar do evento, apesar do apoio oficial, inclusive financeiro. Regiões expoentes em termos de movimento sindical, como São Paulo e Santos, por exemplo, não enviaram representantes ao congresso.

1913 – Cerca de 10 mil pessoas participam de um comício contra a carestia, em 16 de março, no largo São Francisco, no Rio de Janeiro. Em setembro, a COB realiza o 2º Congresso Operário Brasileiro.

1914 – A I Guerra afeta a produção fabril européia. Empresas de vários ramos são transformadas em fábricas de armas e outros produtos destinados à guerra. Os gêneros de primeira necessidade se tornam caros e escassos. No Brasil, o conflito mundial eleva o custo de vida e atiça a ganância de empresários, que querem exportar alimentos e outros produtos para a Europa. Com isso, aumenta a exploração da mão-de-obra local. A redução de jornada, conquistada por muitas categorias anos antes, foi cancelada em boa parte das fábricas.

Em Sorocaba – Também com a desculpa da guerra, empresários aumentam a jornada e reduzem os salários em 25%. Os têxteis entram em greve e ocupam fábricas. Depois de alguns dias, a jornada é reduzida e os salários reajustados. Os ferroviários da Estrada de Ferro Sorocabana entraram em greve pelo mesmo motivo que os tecelões. Porém, por falta de organização e sob repressão policial, o movimento fracassa.

Novos tipos de organização

Os operários que até 1915 se organizam por ofícios (sindicato dos torneiros, dos mecânicos, dos ferramenteiros, etc), começam a se unir por ramos de atividade (metalúrgicos, têxteis, etc). Nessa época são criados também grupos mais amplos de representação, como Centro das Classes Operárias, Centro Protetor dos Operários, Liga Operária Italiana, etc. Surgem também as federações: Federação Operária de São Paulo, Federação dos Trabalhadores do Rio de Janeiro, etc. O governo não reconhece oficialmente essas organizações.

1917 – A paralisação de 2000 trabalhadores da tecelagem Crespi, em São Paulo, iniciada em 10 de junho, se transforma em uma greve geral na cidade e que se estendeu para várias partes do estado. Os tecelões da Crespi exigiam o fim da ampliação da jornada (trabalho noturno) e reajustes salariais de 15% a 25%. No dia 15, como a empresa não queria ceder às reivindicações, os funcionários organizaram uma passeata. A polícia reprime a manifestação e prende vários trabalhadores. O resultado foi que, duas semanas depois, a paralisação já atinge cerca de 5 mil trabalhadores de várias categorias na cidade.

No dia 9 de julho, o sapateiro Antônio Martinez, de 22 anos, é assassinado pela Força Pública de São Paulo durante uma manifestação no bairro Brás. O enterro foi acompanhado por 10 mil pessoas. Poucos dias depois, a paralisação já atinge 70 mil trabalhadores de São Paulo. A capital se transforma em praça de guerra, com tiroteios, polícia, forças armadas nas ruas e saques a armazéns. A essa altura, a greve é liderada pelo Comitê de Defesa Proletária, formado principalmente por anarco-sindicalistas.

O comitê organiza e unifica as exigências dos trabalhadores: aumento de 35% para os salários mais baixos, proibição do trabalho de menores de 14 anos, fim do trabalho noturno para mulheres e menores de 18 anos, jornada diária de 8 horas, congelamento de preços dos alimentos e redução de 50% no preço dos aluguéis, entre outras.

Como o impasse entre trabalhadores, patrões e governo parecia não ter fim, um comitê de jornalistas se ofereceu para mediar o diálogo entre esses setores.

No dia 15, após várias negociações, patrões e governo fazem a seguinte proposta: reajuste salarial de 20%, pagamento mensal de salários fixos, libertação dos presos durante a greve, recontratação dos grevistas e as promessa de melhorias das condições de trabalho e direito de reunião aos funcionários. A proposta é anunciada no dia 16 em várias assembléias, que chegam a reunir até 8 mil trabalhadores. A maior parte dos operários de São Paulo volta ao serviço. Porém, em vários locais o acordo foi ignorado pelos patrões e as paralisações prosseguiram até o final do mês.

A greve geral chegou a Sorocaba em meados de julho. Cerca de 10 mil operários da cidade aderiram, paralisando fábricas de tecidos e de arreios, confecções, comércio, bondes e as oficinas da Sorocabana Railway.

Poucos meses após a greve, para tentar conter a insatisfação crescente entre os operários, o Conselho Municipal de São Paulo aprova um regulamento proibindo o trabalho do menor de 14 anos e limitando a seis horas diárias a jornada dos menores de 18 anos.

Ainda em 1917, motivado pelas pressões populares, o deputado Maurício de Lacerda apresenta um projeto na Câmara Federal que busca proibir o trabalho infantil e estabelecer a jornada diária de oito horas para os adultos no país. Devido à reação patronal em São Paulo (veja quadro) e à falta de representação operária entre os parlamentares, o projeto é rejeitado.

No final do ano, com a desculpa da guerra mundial, o governo decreta estado de sítio, suspende garantias individuais e coletivas, fecha sindicatos e prende operários.

Em Sorocaba, é fundada, pelos irmãos Scarpa, a Ferraria Agrícola Nossa Senhora Aparecida, que mais tarde viria a ser a Siderúrgica N.S. Aparecida.

Trabalho Infantil

Em 1917, cerca de 50% dos operários brasileiros eram menores de 18 anos. Eram comuns nas indústrias os trabalhadores com 5 ou 6 anos de idade. Jornais relatavam espancamentos de crianças operárias por encarregados e donos de fábricas. Assim como as mulheres operárias, os menores recebiam geralmente metade do salário do trabalhador adulto. Mesmo diante dessa realidade degradante, empresários paulistas reagem contra as tentativas de regulamentação do trabalho do menor efetuadas pelo Conselho Municipal de São Paulo e pela Câmara Federal no final de 1917. Até mesmo o capitão-de-indústria Jorge Street, considerado “progressista” por seus pares, condena a medida sob a desculpa que proibir a contratação de crianças pela indústria causaria “desorganização do trabalho fabril”.

1919 – O governo reprime o 1º de Maio em todo o país. Cinco dias depois, um jovem líder da União Operária de São Bernardo, Constantino Castelani, é assassinado pela polícia enquanto discursava em cima de um caixote nos portões de uma fábrica em Santo André. Ele criticava o trabalho noturno. À partir daí, eclodiram greves em várias partes do país. Segundo o jornal A Plebe, após uma semana de movimento havia perto de 50 mil grevistas na região de São Paulo, entre têxteis, padeiros, gráficos, metalúrgicos, costureiras e funcionários de frigoríficos. As principais reivindicações são a jornada diária de 8 horas, o fim do trabalho infantil e do trabalho noturno para mulheres. Até o final da greve, em meados de maio, o jornada de 8 horas foi implantada em muitas fábricas. Em vários casos, o que houve na verdade foi uma reconquista da redução de jornada, cancelada no início da I Guerra Mundial.

Por outro lado, a repressão contra o movimento sindical continua. Estima-se que mais de 100 trabalhadores estrangeiros, classificados como “indesejáveis” pelo governo, são expulsos do país somente nesse ano. Estima-se que 50% dos empregados da indústria em São Paulo e 40% no Rio são imigrantes. Vinte anos antes, esse índice era de 90%.

Ainda em 1919, o governo esboça uma primeira legislação trabalhista para o Brasil, que inclui normas sobre acidentes de trabalho, reivindicadas há tempos pelo movimento sindical. Porém, a lei raramente foi cumprida.

1920 – Segundo o senso desse ano, já somam 275 514 mil os operários no Brasil. Mais de 40% desse contingente é formado por mulheres e crianças menores de 14 anos. Além disso, boa parte dos trabalhadores considerados “adultos” são, na verdade, adolescentes com menos de 18 anos. No total, mulheres, crianças e adolescentes compunham mais de 50% da força de trabalho empregada. A maior concentração industrial do país está em São paulo, com 83 998 operários, seguido pelo Rio de Janeiro, com 56 229, e Rio Grande do Sul, com 24 661 trabalhadores em indústrias. As greves chegam a durar várias semanas e, na maioria das vezes, são por aumento salarial. As escassas leis trabalhistas e sociais do país não são cumpridas. O único direito concreto do assalariado era votar, normalmente em candidatos indicados ou impostos pelos patrões. Descontados os estrangeiros impedidos de votar ou amedrontados pela repressão; as mulheres, que não tinham direito a voto; as crianças e os adolescentes, os operários representam cerca de 3% do total de eleitores do país.

Mudanças no sindicalismo

A revolução russa de 1917, que havia contado com a participação popular, vinha fortalecendo as correntes sindicais comunistas em diversos países, inclusive no Brasil. Como o partido comunista passava a maior parte do tempo na clandestinidade, seus simpatizantes buscavam conseguir espaço de atuação concreta nos sindicatos. Uma das propostas dos comunistas para o movimento operário era a formação de sindicatos por ramos industriais, e não mais por profissões.

Nesse quadro, o anarco-sindicalismo brasileiro entra em declínio, mas não desaparece. Continua disputando espaço por vários anos com os comunistas. Ambas ideologias coexistiam com outras tendências no sindicalismo, como a católica e a trabalhista. Esta última era composta por sindicalistas chamados “amarelos”, que defendiam a aproximação com a burguesia industrial e com o governo e pregavam o sindicalismo assistencial, sem lutas. A partir da década de 50, os “amarelos” passariam a ser chamados de “pelegos”.

– já a corrente sindical baseada no comunismo tinha no filósofo alemão Karl Marx seu mentor intelectual. As bases da ideologia eram (em resumo):

– anti-capitalismo

– criação de um partido político para representar os operários

– igualdade social

– fim das classes sociais

– fim da propriedade privada

– implantação, via revolução popular, de um Estado Operário, sob o regime de “ditadura do proletariado”

1922 – O mês de fevereiro é marcado pela Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo. Durante os três dias de evento, artistas de diversas áreas escandalizam e revolucionam o meio cultural ao misturar estilos e tendências artísticas diversas a elementos do cotidiano, inclusive relativos à classe operária.

Já em 25 de março é fundado, durante congresso no Rio de Janeiro, o Partido Comunista do Brasil, o PCB.

Mas em 22, o grupo mais ativo de pessoas descontentes com a situação social e política do país é formado por tenentes do Exército. Em 4 de julho, um grupo desses tenentes toma o Forte de Copacabana. As tropas do governo Arthur Bernardes bombardeiam pesadamente o Forte. A grande maioria dos 302 amotinados, desiste do combate. No dia 6, restam apenas 29 revoltosos, que partem para uma missão suicida: marchar pela avenida Atlântica para enfrentar as tropas leais ao governo. Já nas ruas do Rio de Janeiro, 11 revoltosos desistem da marcha. Restam então apenas 18 homens, os “18 do Forte”. Em plena avenida, um civil, o engenheiro Otávio Correia, se junta aos insurgentes para lutar contra 3000 soldados legalistas. Apenas dois tenentes sobrevivem ao confronto: Siqueira Campos e Eduardo Gomes. A revolta é usada como argumento pelo presidente para decretar estado de sítio, mantido até o final do seu mandato, em 1926. Apesar da derrota, a insatisfação de uma parcela dos militares sobrevive pelo país. Os integrantes do “tenentismo” reivindicam melhorias sociais e mudanças eleitorais, entre elas o voto secreto.

1923 – O jornal O Estado de São Paulo publica, no dia 21 de dezembro, um artigo elogiando a atitude do delegado de >Sorocaba< Braulio de Mendonça Filho, que havia instituido na polícia local as fichas de “identificação operária”. Em parceria confessa com empresários, os policiais acompanhavam a vida de cerca de 20 mil trabalhadores sorocabanos no final de 1923.

O objetivo do delegado era tentar evitar greves na cidade, acompanhando pelas fichas o passado político-sindical dos operários. O artigo no jornal relata que havia muitas greves em Sorocaba e que, em geral, eram “coroadas de êxito”.

A iniciativa do delegado deu origem a uma greve geral por tempo indeterminado na cidade. Aos poucos, os operários foram vencidos pelo cansaço, pela falta de dinheiro, pelo corte no crédito no comércio e pela perseguição policial. No fim, foram as fábricas que decidiram permanecer fechadas enquanto todo o pessoal não estivesse identificado. O que de fato aconteceu.

A visão policialesca se difunde rapidamente entre o empresariado nessa década, que se acostuma a contratar operários não através do departamento de pessoal da empresa, mas via delegacias de polícia.

Em agosto, o governo assina a Lei de Imprensa, que torna legal o empastelamento de jornais, a invasão de redações pela polícia e a prisão de jornalistas. O Jornal do Brasil, Imparcial, Gazeta de Notícias e os jornais sindicais, como A Plebe, estão entre os mais visados.

1925 – Militares de São Paulo juntam-se à tropa de Luís Carlos Prestes, do Rio Grande do Sul, e formam a famosa Coluna Prestes, que percorreu o país por quase dois anos enfrentando e vencendo as tropas do governo. Enquanto isso, o sindicalismo concentra suas reivindicações na semana inglesa de trabalho (jornada de 8 horas por dia e 36 horas ininterruptas de descanso na semana). Em várias categorias, como a dos sapateiros e dos operários da construção civil, essa conquista é alcançada através de greves e acordos.

1926 – Em novembro, Washington Luís assume a presidência do Brasil. O estado de sítio, decretado em 1922, é suspenso. Líderes operários de várias tendências, principalmente comunistas, criam o BO (Bloco Operário), que elege um deputado. O ministro da Fazenda do novo presidente é o gaúcho Getúlio Vargas, que começa a despontar na cena política e que pouco depois se tornaria presidente do Rio Grande do Sul.

Legislação Trabalhista

De 1923 a 1926 foram criadas várias leis trabalhistas, como a estabilidade no emprego, o direito de aposentadoria, férias de 15 dias por ano e proibição de trabalho ao menor de 14 anos. Porém, como no caso das normas sobre acidentes de trabalho, de 1919, as leis existiram praticamente só no papel. Quase sempre o respeito à legislação era conquistado à base da mobilização dos próprios assalariados.

Mesmo sem ter o costume de acatar as leis trabalhistas, o patronato não deixava de marcar sua posição crítica em relação a qualquer “benefício” concedido aos trabalhadores. Logo após o decreto de outubro de 1926, sobre as férias anuais, associações empresariais paulistas enviaram um relatório ao governo condenando a medida. A redação do documento foi confiada a Otávio Pupo Nogueira, que mais tarde se tornaria secratário-geral da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). O trecho abaixo, extraído do relatório, é um dos mais reveladores do pensamento empresarial da época:

“(…) o homem do povo cujas faculdades morais e intelectuais não foram afinadas pela educação e pelo meio cuja vida física, puramente animal, supera de muito a vida espiritual… que fará um trabalhador braçal durante 15 dias de ócio ? (…) Para nosso proletário, para o geral do nosso povo, o lar é um acampamento (…) ele procurará matar as suas longas horas de inação nas ruas (…) e não vamos insistir nos perigos que ela (a rua) representa para o trabalhador inativo, inculto, presa fácil dos instintos subalternos que sempre dormem na alma humana, mas que o trabalho jamais desperta (…) as férias operárias virão quebrar o equilíbrio moral de toda uma classe social da nação (…)”.

1927 – O Bloco Operário se transforma em BOC (Bloco Operário-Camponês), que elege dois vereadores no Rio de Janeiro.

1928 – Circulam nas fábricas os jornais operários “O Internacional”, “O Trabalhador Gráfico”, “A Vida”, “O Sapateiro”, “Voz Cosmopolita”, entre outros.

O empresariado urbano, também preocupado em organizar sua classe e disciplinar a defesa de seus interesses, funda o Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo), que mais tarde daria origem à poderosa Fiesp (federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

1929 – O BOC lança candidato a presidente, mas é proibido de fazer propaganda e seus membros são perseguidos. O partido acabaria no ano seguinte.

Washington Luís abre uma crise política ao indicar Júlio Prestes, um paulista como ele, para sucedê-lo na presidência. Foi o rompimento da política do “café-com-leite”, através da qual paulistas e mineiros se alternavam no poder.

Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba se unem na Aliança Liberal para disputar a presidência em 1º de março de 1930. O candidato é Getúlio Vargas.

1930 – A crise econômica mundial causada pela queda da Bolsa de Valores de Nova Iorque (o crack na bolsa) no ano anterior afeta o Brasil. A crise causou queda brusca no preço da saca do café, dando início a um processo de decadência da agricultura cafeereira, que ainda era a atividade predominante na economia nacional. A indústria, que já vinha conseguindo produzir além do consumo interno, enfrenta uma retração temporária. A população sofre conseqüências como o desemprego, o aumento do custo de vida e a redução salarial. Washington Luís insiste em afirmar que a “questão social no Brasil é uma questão de polícia”.

Mesmo com uma plataforma conservadora, o candidato do governo vence as eleições presidenciais. A oposição conspira para evitar a posse. O paraibano João Pessoa, candidato a vice de Getúlio Vargas pela Aliança Liberal é assassinado. O motivo teria sido um conflito político local na Paraíba. Ainda assim, o assassinato repercute em todo o país como uma ação do governo.

O então presidente do estado de Minas Gerais Antônio Carlos de Andrada declara “Façamos a revolução antes que o povo o faça”. Parte dos tenentistas, que representavam o desejo da classe média de participar do poder, adere à insurreição planejada pela Aliança Liberal. Washington Luís é deposto no dia 24 de outubro.

O movimento operário organizado não participa da revolução, embora logo depois ele passe a ser visto por Vargas como uma das principais bases de sustentação política de seu governo.

Em Sorocaba, a indústria metalúrgica mais expressiva era a fábrica de enxadas, fundada em 17. Nela trabalhavam cerca de 50 funcionários, que produziam as famosas enxadas “ZAP”.

1931 – O governo impõe o decreto de sindicalização, que submete os sindicatos patronais e de operários ao controle do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, que por sua vez fora criado em novembro de 1930, logo após a revolução. O novo ministério é chefiado por Lindolfo Collor, avô de Fernando Collor, presidente que seria afastado do poder 61 anos depois.

O decreto determina que só pode existir um sindicato por base territorial (unicidade sindical) e este deve ser reconhecido oficialmente pelo governo, que se dá o direito de fiscalizar a entidade, inclusive enviando representantes às assembléias de trabalhadores. Para minar a influência dos ideais libertários dos imigrantes no comportamento do operariado, o decreto exige que 2/3 do total de sócios de cada sindicato sejam brasileiros natos ou naturalizados. Para os cargos de direção sindical, os naturalizados devem ter pelo menos 10 anos de residência no país e os estrangeiros, no mínimo 20 anos.

1932 – O país era governado sem Constituição. O poder legislativo estava fechado. As leis são impostas por decreto. Os grupos que haviam apoiado Vargas em 30 estavam descontentes, em especial a burguesia paulista. Ciente disso, o presidente cada vez mais canaliza seus esforços para ganhar a simpatia da classe trabalhadora; ao mesmo tempo em que investe no controle sobre sindicatos e associações. Nesse cenário, em 9 de julho, estoura no estado de São Paulo a Revolução Constitucionalista, que tinha como sómbolo a sigla MMDC, em homenagem aos paulistas Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, mortos em maio por getulistas durante uma manifestação pública. Poucos dos cerca de 200 mil operários do estado se alistam. A esperada ajuda de outros estados não chegou. A tentativa de revolução é derrotada em três meses.

1933 – Apesar da derrota militar, o levante dos paulistas em 32 surte algum efeito. Vargas convoca eleições para formar o Congresso Nacional, que iria discutir uma nova Constituição para o Brasil. Pela primeira vez, as mulheres podem votar. Os partidos operários que conseguem participar das eleições não elegem nenhum candidato.

1934 – Juntamente com a nova Constituição, o Congresso elege Vargas presidente da República. As greves e outros sintomas de insatisfação continuam acontecendo, pois as transformações sociais prometidas durante a Revolução de 30 ainda estavam longe de se tornar realidade.

Legislação Trabalhista

De 1931 a 34, o governo cria ou regulamenta várias leis trabalhistas, como a jornada de 8 horas para o comércio e a indústria, normas de trabalho para mulheres e crianças, lei de férias, licença gestante de dois meses, estabilidade no emprego e direito de aposentadoria para várias categorias. São implantadas também as Juntas de Conciliação e Julgamento que, em 1939, dariam origem à Justiça do Trabalho.

Perfil social

No início da década de 30, tanto o perfil da classe patronal quanto do trabalhador estava mudando. A elite acirrava o debate sobre conservadorismo e liberalismo econômico. Havia discussões sobre a prioridade de investimentos ao país: agricultura ou indústria. Ao mesmo tempo, o poder econômico começava a passar das mãos dos latifundiários para a burguesia urbana. Já no meio operário, os trabalhadores urbanos estrangeiros deixavam de ser maioria para dar lugar ao brasileiro recém-chegado da roça, normalmente menos politizado. Getúlio Vargas busca o apoio dos sindicatos e investe em entidades de classe leais ao governo, mas procura coibir a existência das organizações operárias mais críticas em relação à sua administração.

1935 – Em janeiro, grupos de oposição formam a Aliança Nacional Libertadora (ANL), presidida por Luís Carlos Prestes, ligado ao partido comunista desde o início da década. A ANL defende a liberdade garantida para o povo, um governo popular, o não-pagamento da dívida externa, a reforma agrária e a nacionalização das empresas estrangeiras no Brasil. O grupo de Prestes se opõe ao movimento chamado Ação Integralista Brasileira, liderado por Plínio Salgado, um escritor modernista que destoava dos ideais democráticos da maioria dos seus antigos companheiros da Semana de Arte de 22. Os integralistas apóiam Vargas e pregam um regime de governo inspirado do fascismo italiano, chefiado por Benito Mussolini.

Em julho, um operário têxtil simpático à ALN é assassinado durante confronto com integralistas. Logo em seguida, têxteis, padeiros e ferroviários cariocas entram em greve para protestar contra o assassinato. Ainda em julho, a ALN é considerada ilegal por Vargas, enquanto a Ação Integralista continua atuando livremente.

Em 27 de novembro, a organização de Prestes tenta uma insurreição contra o governo, acionando grupos armados no Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Os focos de revolta conseguem pouco apoio popular e são derrotados em poucas horas. A insurreição é apelidada pela direita de “Intentona Comunista”. Vargas utiliza uma Lei de Segurança Nacional, aprovada pelo Congresso em abril, para fechar sindicatos que se opunham ao governo. O presidente utiliza também o novo estado de sítio, decretado dias antes do levante, para perseguir, prender e torturar livremente as lideranças de oposição, principalmente da ALN. Luís Carlos Prestes é capturado em março de 36 e condenado a 16 anos de prisão.

Luís Carlos Prestes e Olga Benário

No início de 1936, poucos meses depois do levante comunista, a polícia getulista chefiada por Filinto Müller captura o líder da Aliança Nacional Libertadora Luís Carlos Prestes e também sua mulher, a alemã Olga Benário Prestes. Grávida de sete meses, Olga foi entregue pelo governo brasileiro à Alemanha nazista. Judia e comunista, ela foi morta em 1942, aos 34 anos, em um campo de concentração na cidade de Bernburg. Logo após ser capturado, Prestes foi condenado a 16 anos de prisão, mas acabou sendo libertado 9 anos depois devido à anistia decretada por Vargas em 1945. Logo em seguida, Prestes acompanha a diretriz do Partido Comunista e passa a apoiar Vargas.

Uma sorocabana na ANL

Em dezembro de 36, logo após a tentativa de insurreição liderada por Prestes, a polícia de Vargas prendeu, no Rio de Janeiro, o secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, o baiano Antônio Maciel Bonfim, 31 anos, conhecido como Miranda. Junto com ele foi presa sua companheira, a sorocabana Elvira Cupelo Colônio, a Garota, de 20 anos. Ao ser pega, Elvira disse aos policiais que viajara à pé os 480 quilômetros que separam Sorocaba-SP do Rio de Janeiro, onde foi empregada doméstica até conhecer Miranda, se apaixonar por ele, passar a militar no Partido Comunista e viver na clandestinidade. Na prisão, Elvira se tornou uma personagem controvertida. Era vista como louca por uns e como traidora por outros. Mas o fato é que ela delatou friamente e ajudou a identificar diversos militantes da ALN. Elvira chegava a entregar informações sobre o partido à polícia soltando sonoras gargalhadas e sem se intimidar com a presença de outros presos políticos. Em poucos meses, a Garota foi libertada e novamente detida pela polícia diversas vezes. A cada volta sua à prisão, novos dirigentes do partido caiam em seguida nas mãos dos policiais. Ciente desses fatos, o PCB abriu um “inquérito” sobre o assunto, concluindo que a sorocabana de fato colaborava com os agentes de Vargas. A sentença de Elvira: a morte. Em uma de suas saídas do presídio, ela foi capturada pelo partido e, duas semanas depois, em fevereiro de 1937, foi executada. Ao saber da morte da mulher, Antônio Maciel Bonfim, que também vinha delatando ex-companheiros, passou a intensificar sua colaboração com a polícia.

Aviso de Vargas à burguesia

Em 1935, pouco antes da tentativa de revolução da ANL, Vargas participou de uma reunião com os maiores empresários do país. O presidente pediu apoio para uma nova legislação trabalhista, que poderia reduzir o descontentamento popular e evitar o crescimento dos focos de convulsão social. Os empresários criticam a proposta de Vargas e se negam a aceitar novos direitos aos operários. Ao final da reunião, o presidente disse a um auxiliar: “Eu estou tentando salvar esses burgueses burros e eles não entenderam”.

1937 – Em 10 de novembro, um ano antes das eleições, Vargas fecha o Congresso Nacional e decreta uma nova Constituição, que o autoriza a permanecer no poder. Nasce a ditadura do Estado Novo. Os partidos são extintos. Vargas aumenta o controle sobre o sindicatos, que passam a funcionar praticamente como repartições do governo. Tanto o sistema de controle de entidades de classe quanto a organização de leis trabalhistas – que anos depois seriam compiladas na CLT – guardam semelhanças com a “Carta del Lavoro”, utilizada pelo regime fascista de Benito Mussolini, na Itália.

Teoria da Conspiração

Para justificar o golpe de Estado, Vargas alegou que o país estava sendo ameaçado pelo “Plano Cohen”, um documento que teria sido descoberto pelo Exército em setembro e no qual constavam estratégias de uma insurreição comunista no Brasil, com apoio da Rússia. Baseado nas “provas da conspiração”, o Congresso foi convocado para votar e aprovar o “estado de guerra”, seguido de suspensão dos direitos constitucionais. Daí para a ditadura total passaram-se apenas algumas semanas. Mais tarde se descobriu que o Plano Cohen foi forjado pelo capitão Olímpio Mourão Filho, membro do governo e ligado à Ação Integralista Brasileira. Apesar do apoio recebido da AIB para iniciar a ditadura do Estado Novo, no início de 1938 Vargas dissolve a organização fascista. Logo depois, em maio, os integralistas tentam um golpe para derrubar Getúlio, mas fracassam e 1500 conspiradores são presos.

1939 – Em 18 de junho, metalúrgicos de Sorocaba fundam a primeira entidade representativa da categoria que se tem registro: é o Sindicato dos Operários Metalúrgicos e Classes Anexas de Sorocaba. Um representante do Ministério do Trabalho acompanhou a fundação, que aconteceu em assembléia na sede do Sindicato dos Tecelões, na rua Padre Luis, em Sorocaba. A diretoria executiva dessa entidade era formada por Petronilho Damasceno de Lima, presidente; Osório Telles de Medeiros, vice-presidente; Raphael Cazarote, secretário; Manoel Vieira, 1º tesoureiro; e Luiz de Oliveira, 2º tesoureiro.

Em 19 de dezembro, o Sindicato dos Operários Metalúrgicos se instala na rua Monsenhor João Soares, 97. Como quase não há documentos posteriores sobre a entidade, presume-se que ela teve vida curta.

Ainda em dezembro, o governo federal cria o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), encarregado de exaltar a imagem de Vargas e do “Estado Novo” e censurar a imprensa. Somam 1.112.162 os trabalhadores na indústria nesse ano.

1940 – A ausência de atuação crítica e a proximidade com a ditadura fazem os sindicatos perderem credibilidade. O nível de sindicalização no país está em queda. Diante desse fato, Vargas cria o imposto sindical (desconto de um dia de salário por ano) para dar sustentação financeira às entidades leais ao governo. É criado também o salário mínimo. A maioria dos sindicatos prioriza a oferta de assistência médica e odontológica aos sócios ao invés da luta.

Em Sorocaba – A fábrica de enxadas, sob a direção de Luiz Pinto Thomaz desde 1937, contava com cerca de 100 funcionários.

Qualificação Profissional

Em resposta a uma pesquisa do governo, em 1940, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) indica que os cursos profissionalizantes mais necessários para a indústria na época eram para os seguintes (conforme constam em ofício da entidade):

– Mecânico ajustador (geral)

– Mecânico de automóvel

– Mecânico de máquinas e artes gráficas

– Mecânico de máquinas de escritório e estatística

– Operadores mecânicos (torno, freza, plaina)

– Eletricista mecânico

– Eletricista montador/instalador

– Eletricista de rádio e aparelhos

– Ferreiro (ferro e cobre)

– Caldeireiro

– Soldador (elétrico e oxiacetileno)

– Fundidor-moldador

– Moldador-mecânico

– Carpinteiro

Perfil Econômico

Na década de 40, o empresário industrial passa a ser efetivamente sinônimo de riqueza e poder, substituindo de vez a predominância política das oligarquias agrárias, que vinham perdendo influência na estrutura econômica desde o início dos anos 30.

1942 – Em fevereiro, submarinos alemães bombardeiam o navio mercante brasileiro Cabedelo, matando 54 tripulantes. Os ataques à Marinha Mercante se sucedem nas semanas seguintes. Como conseqüência, a população sai às ruas para exigir a entrada do Brasil da II Guerra ao lado dos Aliados. Apesar da simpatia de Vargas pelos regimes totalitários da Alemanha e da Itália, em março o governo brasileiro se vê obrigado a adotar as primeiras medidas diplomáticas contra os países do Eixo. Em agosto, o Brasil declara guerra ao Eixo.

1943 – Em 1º de maio, Vargas promulga a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que reúne leis e conquistas dos trabalhadores da década anterior e traz algumas inovações. A CLT entra em vigor em 10 de novembro. Apesar da maioria dos sindicatos estar atrelada ao governo, grupos de operários, estudantes e intelectuais promovem protestos para exigir democracia e aumento salarial. Uma das críticas da oposição era o fato da CLT não prever proteção ao trabalhador rural. Em novembro, a polícia getulista reprime uma manifestação de estudantes de direito de São Paulo, cujo slogan é “Morra Getúlio ! Viva a Democracia !”. Dois estudantes morrem e 25 ficam feridos no confronto.

1944 – O Partido Comunista Brasileiro (PCB) estava na clandestinidade. Mesmo assim, seus membros organizam o MUT – Movimento Unitário dos Trabalhadores, que se propunha a atuar como uma espécie de central sindical.

1945 – Com o fim da Guerra, a sociedade brasileira acompanha a tendência mundial de democratização. O movimento operário atrelado ao governo destoa do desejo da massa. Enquanto a maioria da população se manifesta contra a ditadura getulista, muitos sindicatos pedem que o povo que aperte os cintos e suporte o arrocho salarial. Já os sindicatos de oposição se transformam em pontos de encontro para discussões políticas sobre os rumos do país. Pressionado pela opinião pública, Vargas decreta anistia aos presos políticos do Estado Novo e marca eleições para dezembro daquele ano. O Partido Comunista, que vinha apoiado o presidente desde a entrada do Brasil na guerra, é novamente legalizado. Os simpatizantes de Vargas lançam um movimento por sua permanência no poder. O refrão é “Queremos Getúlio”. Esse movimento fica conhecido como “queremista”. Temendo outro golpe, como o de 37, setores da burguesia e das Forças Armadas depõem Vargas em outubro de 1945. José Linhares assume a presidência até as eleições de dezembro.

1946 – Em 31 de janeiro toma posse o general Eurico Gaspar Dutra, que vencera as eleições com apoio dos “queremistas”. Em setembro, o Congresso Nacional, também eleito em 45, finaliza a quarta Constituição do Brasil desde a Proclamação da República. Como boa parte dos sindicatos ainda está atrelada o governo, em muitos casos os trabalhadores preferem se organizar em comissões de fábrica para lutar por suas reivindicações. As greves se alastram, pois o custo de vida sobe e os salários estão congelados desde a entrada do Brasil na II Guerra, em 42. Com a mobilização, várias categorias conquistam reajustes.

Em Sorocaba – No dia 24 de fevereiro de 1946, um grupo de metalúrgicos sorocabanos simpatizantes do comunismo funda a Associação Profissional dos Trabalhadores na Indústria Metalúrgica de Sorocaba. A assembléia de fundação é realizada na sede local do Movimento Unitário dos Trabalhadores, o MUT, localizado na rua Brigadeiro Tobias, 42. A diretoria executiva da Associação dos Metalúrgicos é composta por Benedito Ferraz, presidente; Francisco Leão Filho, secretário; e Leandro Daniel de Lima, tesoureiro.

1947 – Com a desculpa de baixar a inflação, Dutra congela outra vez os salários e abre o país para as importações (o congelamento só terminaria em 1951). Uma onda de greves se espalha por vários estados. Em janeiro, Armando Mazzo é eleito, em Santo André-SP, o primeiro prefeito operário do Brasil. Porém, dias antes da posse ele teria seu mandato cassado, juntamente com o de vários vereadores, sob a acusação de serem comunistas. Centenas de sindicatos sofrem intervenção. Líderes operários são presos. Jornais de oposição são fechados. Em maio, O PCB é posto novamente na ilegalidade. Em dezembro, uma greve de ferroviários da Estrada de Ferro Sorocabana paralisa 20 mil trabalhadores.

1950 – Getúlio Vargas volta à presidência – dessa vez por eleição direta – com a proposta de conciliar os interesses de trabalhadores e patrões. O presidente estimula a sindicalização para obter apoio dos operários, mas continua com sua estratégia de controlar sindicatos. Estima-se que nesse ano havia 1.250.000 operários no Brasil.

1952 – O custo de vida subia. Líderes populares organizam, no final do ano, a “Passeata das Panelas Vazias”, para demonstrar que o povo passava fome.

1953 – Em março, comissões de fábricas têxteis e metalúrgicas de São Paulo entram em greve por 60% de reajuste salarial. Eles são seguidos por várias outras categorias, inclusive do interior do estado. É a “Greve dos 300 Mil”. Em 24 de abril, os operários conquistas 33% de reajuste, libertação dos sindicalistas presos e não-desconto dos dias parados. Em junho, Vargas nomeia para o Ministério do Trabalho o gaúcho João Goulart, que contava com a simpatia dos sindicatos. Ao mesmo tempo, o presidente passa a criticar duramente o capital estrangeiro. A postura de Vargas desagrada a muitos da elite brasileira.

1954 – No início do ano, o ministro João Goulart anuncia que pretende aumentar o salário mínimo em 100%. Por pressão do exército, Goulart é demitido logo em seguida. Apesar disso, em 1º de maio, Vargas dobra o valor do salário mínimo. Parte das Forças Armadas se une ao jornalista e político Carlos Lacerda, da União Democrática Nacional, a UDN, para fazer oposição a Vargas. O chefe da segurança do presidente, Gregório Fortunado, planeja o assassinato de Lacerda. O pistoleiro contratado erra o alvo e mata o major da Aeronáutica Rubens Vaz. A oposição pede a renúncia de Vargas, que se suicida em 24 de agosto. Revoltados com a morte do presidente que chamavam de “pai dos pobres”, populares promovem quebra-quebra em várias cidades. Os alvos são principalmente entidades e jornais de oposição a Vargas. O vice Café Filho assume a presidência.

Em Sorocaba – Pouco mais de cinco meses antes do suicídio de Vargas, a Associação dos Metalúrgicos de Sorocaba recebe a autorização do governo – que então era necessária – para se tornar um sindicato. Nasce assim, em 12 de abril de 54, o Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região. Ernesto Bastos, Fioravante Sajo, Euclides Cavichiolli e Jairo de Castro eram alguns dos diretores da associação nesse período.

Logo em seguida, acontece a primeira eleição no sindicato. Para a diretoria executiva são eleitos Ernesto Bastos, presidente; Jairo de Castro, secretário; e Benedito Rosário do Nascimento, tesoureiro. Para suplentes da diretoria, Hermínio Sajo, Francisco Daniel e Nicolau Sajo. A diretoria foi composta ainda por vários outros metalúrgicos que assumiram cargos de fiscalização administrativa (Conselho Fiscal) e representantes para a federação dos metalúrgicos.

1955 – A chapa Juscelino Kubitscheck (JK) para presidente e João Goulart (Jango) para vice vence as eleições de outubro, com apoio do PSD e do PTB, partidos fundados por Vargas. O slogan de JK é “Vamos crescer 50 anos em 5”. A UDN de Carlos Lacerda tenta, sem sucesso, impedir a posse, que aconteceu em janeiro de 56.

O período JK foi de intenso desenvolvimento. Porém, a falta de projeto para a questão agrária, as poucas verbas para educação e saúde e os grandes empréstimo obtidos junto ao FMI e a bancos estrangeiros deram origem a muitas críticas da oposição e do movimento popular.

1957 – Em fevereiro, cerca de 3 mil operários iniciam a construção de Brasília. Os trabalhadores das obras da nova capital ficaram conhecidos como candangos. Cerca de um ano após o início das obras, os cangangos já somam 30 mil.

Uma greve geral em outubro, por aumento salarial, pára 400 mil trabalhadores por dez dias em várias categorias de São Paulo.

Novas Indústrias – De 56 a 61 foram instaladas no Brasil a Volkswagen, a General Motors, a Ford, a Willys e a Mercedes Benz. Os salários tiveram um aumento de 15% no período, enquanto a produtividade cresceu 37% e os lucros, 76%. Voltou-se a discutir política no país. Deputados, estudantes, operários e intelectuais criam a Frente Nacionalista, que critica o fato de 32 das 66 maiores empresas instaladas no Brasil serem multinacionais.

Fortalecimento dos sindicatos – Como os sindicatos começaram a agir um pouco mais livremente, desatrelados do governo, o nível de sindicalização cresceu, juntamente com o crescimento da indústria, em especial a metalúrgica. De 54 a 58 houve aumento de 18% no número de sindicalizados no país e 60% em São Paulo.

Migração Nordestina – Entre 58 e 59, enquanto no Centro-Sul crescia a oferta de empregos devido à industrialização, o investimento em energia elétrica e petróleo, à abertura de estradas e à construção de Brasília, o Nordeste enfrentava uma de suas piores secas. Os latifundiários se aproveitavam do desespero da população para explorar ainda mais a mão-de-obra. Os salários não davam nem para a alimentação básica. Diante dessas circustâncias, houve grande êxodo de nordestinos para cidades como Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Os trabalhadores rurais que optam por permanecer no campo criam Ligas Camponesas para lutar por terra e direitos sociais.

Moradia – No final dos anos 50, devido à miséria e a fuga da escravidão dos canaviais, os trabalhadores ocupam terrenos vazios, públicos ou particulares. Crescem os mocambos no Recife, as palafitas em São Luís, os alagados em Salvador, as favelas no Rio, os cortiços em São Paulo e as malocas em Porto Alegre.

1959 – O custo de vida havia aumentado 40%. Faltam alimentos em todo o país devido à seca no Nordeste e às enchentes no Sul. Comerciantes escondem mercadorias. Nesse cenário, apesar do Ministério do Trabalho ainda controlar cerca de 70% dos sindicatos, houve cerca de 80 greves no ano, contra apenas 15 paralisações em 1956.

1960 – As eleições de outubro têm votação separada para presidente e vice-presidente. Jânio Quadros é eleito presidente com apoio da UDN, de oposição; e João Goulart, governista, é eleito vice. Parte do movimento sindical é influenciado pela revolução cubana, que havia acontecido no ano anterior, teve participação popular e implantou o regime comunista na ilha. Por outro lado, os Estados Unidos passam a treinar operários brasileiros no Instituto Americano para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre (IADESIL). Era a CIA formando os futuros interventores de sindicatos após o golpe de 64.

1961 – Em fevereiro, o governo brasileiro nega apoio ao plano dos Estados Unidos de invadir Cuba. Fiel ao seu estilo polêmico, em 3 de agosto, Jânio condecora o astronauta soviético Yuri Gagárin e no dia 19 homenageia o líder revolucionário Ernesto Che Guevara com a medalha da Ordem do Cruzeiro do Sul.

Em 25 de agosto, oito meses após a posse, Jânio renuncia. Sua intenção era que o povo saísse às ruas para pedir a sua volta, o que lhe daria maior respaldo popular e poder político. A população, no entanto, não se manifesta. O vice, Jango, estava em visita à China na época da renúncia. Parte dos militares tenta impedir que ele retorne ao Brasil para assumir a presidência. Eles acusavam Jango de ser “agitador do meio operário”, “amigo dos sindicatos” e “herdeiro de Vargas”. Aí, sim, os brasileiros saem às ruas para exigir a legalidade, representada pela posse do vice. Jango assume a presidência no dia 7 de setembro. Porém, com poderes reduzidos por um regime parlamentarista negociado com os militares. O primeiro-ministro escolhido foi Tancredo Neves.

1962 – O movimento sindical organizou duas greves gerais nesse ano para exigir mais poder ao presidente. Foi a primeira vez no Brasil que se fez greve por motivos políticos, e não econômicos ou trabalhistas. Parte da Igreja, estudantes e operários se unem para exigir as “Reformas de Base”. Desde o ano anterior, o movimento sindical lutava também pelo “abono das 240 horas” ou “abono de Natal”, hoje conhecido como 13º salário, que virou lei em julho de 62.

Reformas de Base – em resumo, os movimentos sociais queriam reforma agrária, reforma do sistema bancário (aplicação dos depósitos em projetos sociais), Lei de Minas (fim da exploração de minérios do país por estrangeiros), reforma administrativa (fim do cabide de empregos) e a regulamentação da remessa de lucros ao exterior, entre outras.

1963 – Através de um plebiscito, em 6 de janeiro, a população decide que o governo brasileiro deve voltar ao regime presidencialista, dando maior autonomia a Jango. Dos 12,7 milhões de votantes, 9,4 milhões disseram não à continuidade do parlamentarismo. O presidente lança o Plano Trienal para tentar conter a inflação. O pacote inclui aumento de impostos dos ricos, achatamento salarial, controle de preços e renegociação da dívida externa. O plano não agrada nem a direita nem a esquerda. Em outubro, trabalhadores da Usiminas entram em greve por aumento salarial e melhoria nos alojamentos. Milhares de trabalhadores aguardam o resultado de uma negociação na fábrica, quando a polícia chega atirando. Testemunhas afirmam que pelo menos 80 operários foram mortos. Os jornais de grande circulação noticiam apenas 7 mortes.

1964 – Jango começa o ano defendendo com mais vigor as reformas de base. No dia 13 de março o presidente anuncia, diante de um comício com 200 mil pessoas no Rio de Janeiro, duas medidas nesse sentido: 1. a nacionalização das refinarias particulares de petróleo e a desapropriação de terras numa faixa de 10 km à beira de estradas e açudes. O comício foi organizado pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), uma espécie de central sindical da época. Em 19 de março, a elite e a classe média de São Paulo, juntamente com a ala conservadora da Igreja, realizam a “Marcha da Família com Deus pela Propriedade”. A marcha reuniu cerca de 500 mil pessoas para protestar contra o que chamavam de “avanço do comunismo” e a implantação de uma “república sindicalista” no Brasil.

Golpe Militar – Nesse cenário, os militares tomam o poder no dia 31 de março. Os partidos são dissolvidos. Cerca de 50 mil pessoas são presas nos primeiros meses após o golpe. Políticos e líderes populares são exilados. As diretorias eleitas de cerca de 500 sindicatos – inclusive em Sorocaba – são destituídas. Interventores do governo militar assumem a direção das entidades. O Congresso Nacional permanece aberto, porém com poderes limitados pelo Ato Institucional nº 1 (AI-1).

1965 – Cerca de um ano após o golpe, os sindicatos começam a realizar eleições. Porém, os estatutos das entidades haviam sido modificados pelos interventores para dificultar a participação de oposições. Pessoas de confiança do regime são preparadas para vencer as disputas. As ofertas de assistência médica e odontológica por sindicatos se sobrepõem às lutas. Apesar da repressão, as manifestações populares continuam acontecendo. Ainda nesse ano o governo drecreta a existência de apenas dois partidos: a Arena (Aliança Renovadora Nacional), governista, e MDB (Movimento Democrático Brasileiro), chamado de oposição consentida. São os partidos do “Sim” e do “Sim, senhor”.

1966 – Em setembro, o FGTS substitui a lei de 1946 que garantia estabilidade no emprego após 10 anos de serviço. Para o caso de demissão antes dos 10 anos, a lei da década de 40 previa também uma indenização equivalente a um mês de salário para cada ano trabalhado.

1967 – Alguns sindicatos se vêem livres dos agentes do regime e articulam o MIA (Movimento Intersindical Antiarrocho), para exigir reajustes salariais. O governo militar promulga uma nova Constituição (a quinta da República), que tem como objetivo legitimar o regime.

1968 – Tornam-se mais intensos os protestos contra a ditadura. No dia 28 de março, o estudante Edson Luís de Lima Souto é morto pela polícia durante manifestação em frente ao restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro. Seguem-se no país vários atos públicos de repúdio ao assassinato. Sorocaba não ficou de fora. Estudantes locais de medicina e filosofia saem em passeata pelas ruas centrais da cidade portando cartazes com frases como “Brasil 68 – Fome Saciada à Bala”.

No mês de abril, os trabalhadores de Contagem (MG), obtém 10% de reajuste após uma greve. Em 1º de maio, manifestantes expulsam representantes do governo que estavam em um ato pelo Dia do Trabalhador na praça da Sé, em São Paulo, para vigiar os participantes. Em junho o reajuste obtido em Contagem é estendido a todo o Brasil como “abono de emergência”. Em julho, uma greve dos metalúrgicos de Osasco (SP) por reajuste salarial é reprimida. Cerca de 400 trabalhadores são presos. O sindicato sofre intervenção. Os metalúrgicos de Osasco foram os primeiros do estado a eleger uma diretoria de oposição após o golpe de 64.

A Universidade de São Paulo (USP) é considerada um reduto da esquerda estudantil na época. Já na Universidade Mackenzie predominam os estudantes de direita, que apoiam o regime. Em 3 de outubro de 68, o estudante secundarista José Guimarães, de 20 anos, simpatizante da USP, é morto à tiros durante confronto entre universitários das duas instituições.

Na manhã do dia 12 de outubro, mais de 1.000 estudantes são presos durante um congresso da UNE (União Nacional de Estudantes), realizado no sítio Muduru, em Ibiúna-SP. O congresso deveria ser clandestino, mas sua realização chegou ao conhecimento do governo em parte por descuido dos próprios jovens, que circulavam abertamente pela pequena Ibiúna e compravam grandes volumes de alimentos no comércio local. Membros da UNE chegaram a comprar centenas de pãezinhos de uma só vez em uma padaria da cidade.

O jornal Cruzeiro do Sul, de Sorocaba, chegou a noticiar o encontro de estudantes dias antes da invasão policial.

Anos de chumbo – Já no final de 1968, dia 13 dezembro, o governo militar decreta o Ato Institucional nº 5 (AI-5). Inaugura-se um dos períodos mais abomináveis da história do país. A censura é oficializada, o Congresso é fechado, a liberdade de organização é cancelada, líderes operários, estudantis e intelectuais são presos, exilados e, muitas vezes, torturados e mortos. Políticos eleitos têm seus mandatos cassados. O governo militar toma para si o poder de suspender direitos políticos de qualquer cidadão, o que implica o impedimento de votar e ser votado em eleições sindicais.

O medo predomina na sociedade e as poucas lutas por liberdade e justiça entram de vez para a clandestinidade.

Luta armada

Após o A-5, tornam-se mais ativos os grupos que desde o golpe vinham optando pela luta armada contra o regime militar. Eles se reúnem em organizações clandestinas de inspiração socialista ou comunista, como a ALN (Ação Libertadora Nacional); a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária); a VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares); o MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro – data da morte de Che Guevara, na Bolívia); PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário); Colina, entre outros. Houve seqüestros para exigir a libertação de presos políticos e assaltos a bancos para financiar a guerrilha.

1969 – Após 10 meses de recesso, o Congresso foi reaberto para aprovar o nome de um novo general-presidente: Emílio Médici, que substituiu Costa e Silva, afastado em agosto por motivo de doença. Com Médici, tornou-se ainda mais brutal a repressão política no país. Estima-se que de 68 a 73, mais de 130 pessoas morreram devido a tortura nos porões do regime militar. Outras 130 desapareceram depois de presas sob a acusação de “subversão”.

No dia 4 de novembro, o ex-deputado pelo PCB e líder da ALN Carlos Mariguella é morto em São Paulo, durante emboscada comandada pelo famigerado delegado Sérgio Paranhos Fleury, acusado de ser um dos policiais mais truculentos da ditadura, comandante de torturas e coordenador do Esquadrão da Morte em São Paulo.

1970 – Os primeiros anos da década de 70 são marcados pela propaganda do governo à respeito do “milagre econômico” brasileiro. Médici obtém empréstimos estrangeiros para alavancar o desevolvimento e atrai multinacionais divulgando que “a mão-de-obra no Brasil é inteligente, abundante, barata e não faz greve. Temos um clima de paz social”. Internamente, o governo adota o slogan “Brasil, Ame-o ou Deixe-o”, para justificar as perseguições políticas. As propagandas do “milagre” e do nacionalismo militarista, aliados à euforia diante da conquista do tricampeonato de futebol mundial, convencem boa parte da população, que aderiu ao ufanismo oficial, segundo o qual “Ninguém Segura Este País”.

Enquanto isso, em termos de distribuição de renda, as pessoas mais ricas do Brasil, que representavam 5% da população, abocanham quase 40% do PIB (Produto Interno Bruto). O PIB é a soma de tudo o que se produz de riqueza no país.

O ministro do Planejamento Delfin Netto tenta contornar o problema social dizendo “é preciso esperar o bolo crescer para depois dividir”. Pequenos jornais de oposição, como “O Pasquim”, “Opinião” e “Resistência”, que relatavam a desigualdade social e a situação econômica, são recolhidos pelo governo e seus jornalistas perseguidos.

Já no final do “milagre econômico”, em 74, o país acumulava uma dívida externa de 17,16 bilhões de dólares. Antes do golpe de 64 a dívida era de 3,1 bilhões.

Nessa época, como no período do Estado Novo, a maioria dos sindicatos é controlada pelo governo. Os trabalhadores procuravam fugir desse controle se organizando em comissões de fábrica.

Sorocabano desaparecido – Ainda em 1970, o estudante Marco Antônio Dias Batista, de 15 anos de idade, nascido em Sorocaba, foi preso em Goiânia onde cursava o segundo grau. Marco era dirigente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e militante da VAR-Palmares. Após a prisão, ninguém teve mais notícias do estudante. Ele entrou para a lista dos desaparecidos políticos no Brasil.

1971 – Carlos Lamarca, ex-capitão do exército e militante da VPR e do MR-8 é morto no dia 27 de outubro, no sertão baiano. Lamarca havia desertado do Exército, em São Paulo, em 69, levando armas e munições para serem usadas na luta armada contra a ditadura.

A operação “Pajussara” (nome dado à caçada militar que resultou na morte do guerrilheiro), comandada pelo então major Nilton Serqueira, mobilizou 215 militares, seis aviões, dois helicópteros e custou cerca de US$ 200 mil, custeados em boa parte por grupos empresariais. Os militares alegaram que ele foi morto ao resistir à prisão. Essa versão foi desmentida em 1996, quando uma exumação do cadáver de Lamarca comprovou que ele fora executado, pois recebeu os tiros quando estava parado, não oferecendo risco a seus perseguidores. Junto com Lamarca foi morto José Campos Barreto, metalúrgico de Osasco.

1973 – Sorocabano assassinado – Mesmo com toda a repressão, acontecem pequenas greves por salários na região do ABC. O assassinato do estudante sorocabano Alexandre Vannucchi Leme, pelos órgãos de repressão em São Paulo, causa comoção na opinião pública. Alexandre tinha 22 anos, era estudante de geologia na USP, representante dos alunos de geociências da universidade e militante da ALN. Ele foi preso no dia 16 de março, sob a acusação de ser “subversivo”, morreu no dia 17 e foi enterrado como indigente no cemitério de Perus no dia seguinte. Presos políticos que estavam no DOI/CODI entre os dias 16 e 17 afirmam que Alexandre foi barbaramente torturado. A família do universitário soube do ocorrido dias depois do provável assassinato, através de denúncia anônima. Na versão oficial, a causa da morte foi atropelamento. Bispos, padres e comunidades eclesiais se manifestaram publicamente contra mais essa arbitrariedade do regime militar. Somente 10 anos depois, em 1983, os familiares de Alexandre conseguiram autorização para resgatar seus restos mortais e sepultá-los em Sorocaba.

Principais Órgão de Repressão em 60/70

DOPS – Departamento de Ordem Política e Social

Oban – Operação Bandeirantes, criada em junho de 69

Doi-Codi – Destacamento de Operações de Operações-Centro de Operações de Defesa Interna, criado em maio de 70.

Cenimar – Centro de Informações da Marinha

OBS: As prisões em geral, mesmo as mais arbitrárias, eram justificadas pela Lei de Segurança Nacional (LSN), criada em 1967.

A vida dos brasileiros é investigada secretamente durante todo o regime pelo o SNI, Serviço Nacional de Informações, criado em 1964, pelo general Golbery do Couto e Silva.

Golpe no Chile

Enquanto os brasileiros lutavam pela redemocratização, o Chile passava por um processo semelhante ao que o Brasil sofrera em 64. Em 1970, os chilenos elegeram Salvador Allende presidente. Allende integrava a aliança partidária Unidade Popular, que tinha como proposta um governo de caráter socialista. De fato, várias medidas de cunho social foram adotadas, mas o governo enfrentou uma intensa campanha de desestabilização organizada pela direita reacionária do país e patrocinada pelos Estados Unidos. Em 11 de setembro, militares chilenos lideram um golpe de Estado. No mesmo dia, Allende se suicida. Uma Junta Militar chefiada por Augusto Pinochet assume a presidência. Como no Brasil, os chilenos só voltariam a escolher seu presidente em 1989.

1974 – Em março, o general Ernesto Geisel assume a presidência do Brasil. Em novembro, houve eleição para deputado e senador. A única oposição permitida, o MDB, consegue eleger maioria de parlamentares em vários estados. Fato que surpreende o governo e o faz pensar em formas de controlar melhor as eleições municipais dali a dois anos. Apesar de amedrontada, parte da sociedade ainda insiste em se manifestar, ainda que timidamente. Operários fazem greves-relâmpago e estudantes organizam passeatas contra o regime.

Guerrilha do Araguaia

Teve fim trágico em 74 a guerrilha rural na região do Araguaia, iniciada dois anos antes sob coordenação do PCdoB. Cerca de 80 guerrilheiros foram para o local em 72 para tentar convencer os camponeses a participar de uma futura revolução e, à noite, treinar com armas na floresta. O exército mobilizou cerca de 20 mil soldados para localizar os “subversivos”. Foi um massacre. Oficialmente houve 15 militantes mortos e 51 “desaparecidos”. Entre os poucos guerrilheiros presos estava o hoje deputado federal José Genoíno Neto, do PT de São Paulo.

1976 – Os assassinatos do jornalista Vladimir Herzog, em outubro de 75, e do metalúrgico paulistano Manuel Fiel Filho, em janeiro de 76, nos porões do regime, sensibilizam a opinião pública e dão origem a uma ampla campanha pela redemocratização do país.

É ano de eleição municipal. O governo estuda formas políticas de conter o avanço da oposição iniciado nas eleições de 74. Em 1º de julho é promulgada a “Lei Falcão”, que limita as mensagens da propaganda eleitoral em rádios e TVs. Os candidatos não podem apresentar suas propostas nos veículos de comunicação. Mesmo na TV, são veiculados apenas o nome, o currículo, o número e a foto do candidato. O objetivo é impedir o debate sobre grandes temas nacionais, como saúde, educação, transporte, democracia e custo de vida.

1977 – Vários setores da sociedade, como estudantes, operários e parte da Igreja católica, se rearticulam contra o regime. Em Porto Alegre acontece o primeiro grande ato público contra as prisões políticas. Manifestações pelo mesmo motivo se sucederam no país e dão origem a uma ampla campanha pela anistia.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, presidido por Luís Inácio da Silva, o Lula, desde 76, começa a despontar como um novo modelo de sindicalismo combativo. Nesse ano, o sindicato liderado por Lula dá início a uma campanha aberta por 34,1% de reajuste, índice que o governo havia feito “desaparecer” da economia anos antes.

1978 – Em 12 de maio, o sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo lidera uma greve na SAAB-Scania, que é considerada um marco contra a ditadura. Os trabalhadores reivindicam reajuste salarial e democracia. A adesão foi maciça. Ao dar seu primeiro grande grito de liberdade depois de 64, os metalúrgicos desafiaram os generais da ditadura. Poucas semanas depois da greve na Scania, a mobilização de operários já se espalhara por várias partes do país.

Em agosto, cerca de 10 mil pessoas se concentram na Catedral da Sé, em São Paulo, para protestar contra a alta do custo de vida. No mesmo mês, o Congresso revoga o AI-5.

Em Sorocaba – Os aliados do regime ainda dominavam o Sindicato dos Metalúrgicos. A oposição foi derrotada nas eleições sindicais de 78, assim como havia sido em 72 e 75. Os principais diretores do sindicato nesse período são Carmo Ferreira da Silva, Benedito Abrão, Wantelino Ribeiro, Benedito Dias Batista, Luis Nunes Ferreira, Rubens Tagliarini, Roque Machado, Antônio Mauro de Abreu e Sidney Soares.

1979 – Em março, o general João Batista Figueiredo assume a presidência prometendo abertura política. Em abril, estoura uma greve geral dos metalúrgicos do ABC. O Sindicato lidera assembléias com mais de 100 mil pessoas no Estádio da Vila Euclides, em São Bernardo. As mobilizações continuam, mesmo após o sindicato sofrer mais uma de uma série de intervenções federais. No final de agosto(ou junho ?) Figueiredo assina a lei da anistia, que finalmente liberta presos políticos e permite a volta de exilados ao Brasil. Em outubro, a oposição metalúrgica de São Paulo lidera uma greve na categoria. O operário Santo Dias é morto pela polícia durante um piquete. As movimentações acontecem sem apoio do sindicato, que é fiel ao regime. Em novembro acaba a lei do bipartidarismo, permitindo a criação de novos partidos políticos.

1980 – Greves em vários pontos do país continuam enfrentando a ditadura. Em fevereiro, líderes do movimento operário fundam o Partido dos Trabalhadores. Em 1º de abril, os metalúrgicos do ABC dão início à “Greve dos 41 dias”. Um ano após a última intervenção, o sindicato é novamente ocupado por representantes do governo, que só vão deixar totalmente a entidade em 81. Em poucos dias, a paralisação atinge várias cidades do estado, inclusive Sorocaba, onde a mobilização é organizada por grupos sindicais de oposição.

Os militares proíbem qualquer ato público pelo Dia dos Trabalhadores, em 1º de maio. São Bernardo amanhece sitiada pelo exército nesse dia. Porém, uma missa na Igreja Matriz da cidade reúne mais de 150 mil pessoas e ganha caráter de grande manifestação, que logo se transforma em passeata. A multidão grita palavras de ordem em homenagem aos trabalhadores e pela libertação de Lula e de outras lideranças sindicais da região do ABC presas no início de abril. Diante da multidão, a repressão silencia e deixa a cidade. Os atos pela libertação de Lula acontecem em várias partes do país. A greve termina no dia 12 de maio. Os sindicalistas são libertados, mas as reivindicações dos metalúrgicos não são atendidas. Um boletim do sindicato no encerramento da greve ressalta que “voltamos (ao trabalho) para evitar a repressão da polícia(…)que os patrões e o governo saibam: atrás de cada máquina eles terão um trabalhador em guerra(…) “.

Atentados de direita – Em 1980, enquanto os adversários do regime ganham força, defensores do autoritarismo explodem bombas em órgãos de oposição ao governo e bancas de jornais pelo país. Os atentados em bancas tinham como alvo jornais de esquerda que começavam a circular com um pouco mais de liberdade, como “O Pasquim”, “Movimento”, “Em Tempo” e “O São Paulo”.

1981 – Em 30 de abril, militares tentam “plantar” uma bomba no Riocentro onde seria realizado um show/comício do 1º de Maio. O plano dá errado e a bomba explode dentro de um carro onde estavam dois oficiais do exército. Um deles morre. Representantes de várias tendências sindicais participam da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora, Conclat, em Praia Grande-SP. Ficam evidentes as divergências dentro do movimento operário. A maior parte era favorável à criação de uma central sindical combativa e de alcance nacional, mas havia outra parcela que considerava a idéia inoportuna. A decisão ficaria para dois anos depois.

Em Sorocaba – Em 1981 são realizadas eleições no Sindicato dos Metalúrgicos. Porém, o prazo de inscrição de chapas é manipulado e a oposição não participa da disputa. O então presidente da entidade, Sidney Soares, que fora candidato a vice-prefeito de Sorocaba pela Arena (partido do governo militar), se mantém no cargo.

1982 – Como conseqüência da abertura política que vinha sendo conquistada nos últimos anos, em 82 realiza-se a primeira eleição direta para governador desde o golpe. Porém, prevalece ainda a Lei Falcão, de 1976, segundo a qual os candidatos não podem apresentar suas propostas ao público. Os governistas vencem em doze estados e a oposição moderada, em dez. O PT, que participava pela primeira vez de uma eleição, elegeu um prefeito, alguns deputados e vários vereadores.

Em Sorocaba, a professora Iara Bernardi foi eleita vereadora pelo partido.

1983 – Chapa da CUT vence em Sorocaba – A oposição metalúrgica de Sorocaba consegue anular na justiça a eleição sindical de 81. Nova votação é marcada para 16, 17 e 18 de agosto. A chapa 3, liderada por Wilson Fernando da Silva, o Bolinha, vence as eleições e dá início a uma nova fase no sindicalismo da região.

As principais propostas da chapa vencedora são: lutar pela organização da classe trabalhadora, pela sua libertação; pelo fim da estrutura sindical atrelada ao governo e aos patrões; pela construção de uma Central Única dos Trabalhadores; por eleições democráticas de Cipas; por salário igual para trabalho igual, pelo contrato coletivo de trabalho, pela criação do salário-desemprego e pelo direito de greve.

A posse aconteceu em setembro na sede da entidade, então localizada na rua da Penha, 748, em Sorocaba. Lula esteve presente.

Divisão da Base Regional – Logo após a vitória da oposição metalúrgica, integrantes da chapa de situação se unem aos patrões e fazem uma campanha para tirar Mairinque da base sindical de Sorocaba. O objetivo dos articuladores da campanha é fazer com que o sindicato não tenha mais acesso aos trabalhadores da CBA (Companhia Brasileira de Alumínio), empresa do grupo Votorantim, instalada em Alumínio, na época distrito de Mairinque. Os pelegos conseguem legalmente a desvinculação de Mairinque e montam uma associação local de metalúrgicos, que poucos meses depois foi reconhecida oficialmente como sindicato.

Fundação da CUT

No dia 28 de agosto, durante o I Conclat (Congresso Nacional da Classe Trabalhadora), realizado em São Bernardo do Campo (SP), é fundada a CUT (Central Única dos Trabalhadores). Pela primeira vez no Brasil surge uma central sindical que reúne trabalhadores do campo e da cidade para apresentar uma proposta de sindicalismo independente e sem vínculos com o governo. O primeiro presidente da central foi Jair Menegueli, atualmente deputado federal.

1984 – Os sindicatos ligados à CUT começam o ano participando de manifestações em várias partes do país pela eleição direta para presidente da República. É a campanha das “Diretas Já”, que também contou com a participação de partidos políticos formados após a anistia, como o PT, o PDT e o PP; com movimento estudantil; com líderes comunitários e com artistas. Um comício da campanha realizado em 16 de abril, na praça da Sé, São Paulo, chega a reunir 1,7 milhão de pessoas. Apesar da pressão popular, a emenda Dante de Oliveira, que convocava eleições diretas, acabou sendo rejeitada pelo Congresso Nacional no dia 26 de abril.

Em Sorocaba – Entre março o abril acontece a primeira campanha salarial liderada pela nova diretoria dos metalúrgicos. A fase é de franco enfrentamento entre sindicato e patrões. Os sindicalistas precisam demonstrar ao empresariado e aos próprios trabalhadores que o sindicato mudou, que não aceita mais acordos de bastidores, sem participação da categoria, que não é mais submisso às imposições do patronato e do governo. Apesar da repressão policial, houve paralisação em diversas fábricas. Contrariando um decreto salarial da época, os metalúrgicos conquistam reajustes acima da inflação em várias empresas. Mais do que os aumentos nos salários, o que surpreende a categoria é o fato de surgir um sindicato preocupado em organizar e mobilizar os trabalhadores, em convocar assembléias, em distribuir boletins informativos. É também a primeira vez desde o golpe militar que uma entidade sindical na região se propõe a debater questões sociais, políticas e econômicas que afetavam a vida dos trabalhadores dentro e fora das empresas.

Ainda em 84, nos dias 16 e 17, acontece o I Encontro dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, com participação de 60 metalúrgicos. Os principais temas discutidos são o apoio do sindicato às comissões de fábrica e a elaboração de um plano de formação política e sindical para a categoria.

1985 – Em 15 de janeiro deputados federais e senadores votam para escolher o primeiro presidente civil em 21 anos. O mineiro Tancredo Neves, que havia apoiado a campanha “Diretas Já” vence Paulo Maluf, homem de confiança dos militares. A eleição é indireta, pois a população não pode votar. Tancredo obtém 480 votos do chamado Colégio Eleitoral e Maluf, 180. No dia 14 de março, faltando poucas horas para sua posse, o futuro presidente é internado às pressas em Brasília, sendo submetido a uma cirurgia no abdômem. Quem recebeu a faixa presidencial foi o vice José Sarney, que até pouco tempo havia sido do PDS (partido governista que substituiu a Arena). Tancredo morreu no dia 21 de abril e Sarney assumiu definitivamente a presidência.

O desemprego e a recessão cresciam de maneira preocupante em 1985. A economia estava em frangalhos. Os militares haviam deixado uma dívida de US$ 100 bilhões ao país. A CUT inicia uma campanha pela redução da jornada de trabalho para 44 horas semanais (a jornada na época era de 48 horas). O objetivo da redução é gerar mais postos de trabalho.

Em Sorocaba – O sindicato dos metalúrgicos de Sorocaba se engaja na campanha pela redução da jornada. Estouram greves em várias fábricas da categoria por esse motivo. Diversos militantes sindicais de base são demitidos. A redução da jornada só viria três anos depois, com a nova Constituição federal.

Nessa época, estimulados pela experiência dos metalúrgicos, oposições de outras categorias se organizam para derrotar os pelegos e direcionar os sindicatos para uma linha de atuação combativa. Foi o que aconteceu com o têxteis de Sorocaba e Votorantim. Uma chapa de oposição venceu as eleições em setembro de 1985 e tornou os trabalhadores em fiação e tecelagem a segunda categoria cutista da região.

Também em setembro de 85, no dia 24, o sindicato dos metalúrgicos, que já vinha tuando na CUT desde a sua fundação, recebe o aval da categoria, durante assembléia, para se filiar oficialmente à central.

1986 – Em fevereiro, Sarney lança o Plano Cruzado, congela os preços e muda a moeda brasileira. O plano conseguiu a simpatia de grande parte da população. Muitos se transformam em “fiscais do Sarney”, vigiam preços e brigam com os adversários do plano e do presidente.

Enquanto divergências internas causam a divisão da CUT em duas correntes, “Articulação” e “CUT pela Base”, outros sindicatos, ainda atrelados ao governo, fundam a CGT – Central Geral dos Trabalhadores.

No que diz respeito à orientação política, a atuação da CGT oscila entre o centro e a direita. Já as correntes internas da CUT continuam a se autodefinir como de esquerda. Tanto “Articulação”quanto “CUT pela Base” concordam com os princípios da central, mas divergem nas formas de atuação sindical, de organização e de formação dos trabalhadores.

Nos últimos meses do ano, o Plano Cruzado já dá sinais de fracasso. As eleições para governadores, deputados estaduais, federais e senadores serão realizadas em 15 de novembro. Sarney afirma publicamente que o plano está seguro e não haverá mudanças que signifiquem perdas para a população. O partido do presidente, PMDB, é o grande vitorioso nas urnas. Menos de uma semana depois das eleições, em 21 de novembro, o governo decreta o Plano Cruzado II, que inclui drástico descongelamento de preços e redução dos reajustes salariais baseados na inflação. A população se sente traída. Crescem os protestos contra Sarney.

Em Sorocaba – Nos dias 17 e 18 de abril de 1986, os motoristas rodoviários (condutores) de Sorocaba elegem a primeira chapa de simpatizantes da CUT para a direção do seu sindicato. Já nos dias 12, 13 e 14 de agosto é a vez do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba realizarem novas eleições. Três chapas participaram da disputa. Duas são da CUT: a chapa 1, encabeçada por Wilson Fernando, o Bolinha; e a chapa 2, encabeçada por João Batista, o Batistão. Já a chapa 3, encabeçada por Wilson André, é formada por adversários da CUT e conta com o apoio de empresários. Houve momentos de violência durante a disputa. A maior parte dos conflitos aconteceu entre uma das chapas cutistas e a chapa 3, considerada pelega. A chapa 1 vence as eleições. Entre os membros da chapa vitoriosa estava Hamilton Pereira, hoje deputado estadual pelo PT.

Mortes no Campo

A lentidão da reforma agrária fez crescer a tensão no campo durante o governo Sarney. De um lado, o Movimento dos Sem-Terra (MST) se tornava cada vez mais atuante. De outro, a UDR (União Democrática Ruralista) pregava a criação de milícias armadas para enfrentar posseiros, além de se opor a qualquer iniciativa legal que buscasse agilizar a desapropriação de terras improdutivas. Nesse cenário, entre janeiro e maio de 1996, cerca de 100 trabalhadores rurais foram mortos no Brasil por jagunços à serviço de latifundiários. Também em maio, o padre Josimo Tavares, membro da Pastoral da Terra, é assassinado por um pistoleiro no Maranhão. No mesmo mês, o MST demonstra seu grau de mobilização: Cerca de 100 mil colonos de diversos estados se concentram em Porto Alegre para participar de uma romaria, denunciar a situação de miséria dos sem-terra e exigir reforma agrária.

1987 Projeto Aramar – O sindicato dos metalúrgicos coloca entre suas prioridades nesse ano a luta contra o projeto Aramar, um centro de enriquecimento de urânio da Marinha que estava sendo instalado em Iperó, dentro da Fazenda Ipanema. Seguem-se manifestações contra a usina em diversas cidades da região. Estudantes, intelectuais, artistas, líderes comunitários, comunidades eclesiais e trabalhadores rurais – que já haviam se tornado parceiros habituais do movimento sindical – se unem para denunciar os riscos e o desperdício da aventura nuclear liderada pela marinha brasileira e patrocinada pelo governo com dinheiro público.

Ganha destaque nessa época a atuação de grupos ecológicos da região, como o NEMI, Núcleo Ecológico Morro do Ipanema, liderado por Gabriel Bitencourt, do PT de Sorocaba.

Em Sorocaba – Em dezembro é realizado, em Campinas, o 2º Encontro dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região. Participam 108 pessoas, entre dirigentes, trabalhadores da base e funcionários do sindicato. As principais resoluções são: reforçar o trabalho com as comissões de fábrica, Cipas e militância de fábrica; definir uma política de atuação nas pequenas e médias empresas; fortalecer as lutas de apoio aos sem terra e contra Aramar; organizar a campanha salarial de 1988; iniciar um programa de formação profissional; dar apoio à cultura e investir na compra de uma sede própria para o sindicato (o prédio da Penha pertencia à federação oficial dos metalúrgicos e fora cedido ao sindicato de Sorocaba em 1963).

1988 – No dia 7 de abril, o presidente José Sarney inaugura Aramar, enquanto no centro de Sorocaba acontece uma passeata que reúne milhares de pessoas para protestar contra as experiências nucleares na região.

No plano nacional, 88 é ano de debates sobre a nova Constituição, que estava sendo votada em Brasília. O presidente da 5ª Assembléia Nacional Constituinte, instalada oficialmente em fevereiro do ano anterior, é o deputado federal Ulysses Guimarães, do PMDB. O metalúrgico Lula, deputado federal pelo PT, está entre a bancada que defende maiores direitos sociais aos brasileiros. A nova Constituição é promulgada em 5 de outubro. São aprovados vários avanços democráticos para a sociedade, como a eleição direta para presidente, o direito de voto aos analfabetos, o voto facultativo aos 16 anos, o fim da censura e a aceitação de emendas constitucionais propostas pela população (emendas populares).

Na área trabalhista também houve conquistas, como a garantia de direitos ao trabalhador rural, o direito de greve, a redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais, o seguro-desemprego, o aumento da multa sobre o FGTS em caso de demissão e a elevação das licenças maternidade e paternidade, entre outras.

Ainda em 1988, junho, o Congresso Nacional aprova mais um ano de mandato para Sarney, apesar do alto índice de rejeição popular do presidente na época. O movimento sindical e os partidos de oposição denunciam que os cinco anos de mandato para Sarney foram obtidos através das manobras de um grupo de parlamentares conservadores que formaram um bloco apelidado de “Centrão”. Os integrantes desse grupo são acusados de receber favores e benefícios em troca do apoio ao presidente, o que inclui a concessão de emissoras de rádio e TV. O deputado federal sorocabano Theodoro Mendes, do PMDB, é um dos integrantes do “Centrão”. Fato amplamente denunciado por sindicatos da CUT na região de Sorocaba na época.

De acordo com avaliação do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), a atuação de Theodoro Mendes como deputado constituinte teve nota 4,75, numa escala de 0 a 10. A nota se refere ao comportamento do parlamentar diante de questões de interesse dos trabalhadores.

Em 9 de novembro desse ano, 1300 soldados do exército e da PM invadem a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda (RJ), para retirar os metalúrgicos em estavam em greve dentro da indústria. As reivindicações são reajustes salarial e implantação do turno de 6 horas. O saldo da intervenção militar é de três operários mortos, um deles com o crânio esmagado à coronhadas. Outros 9 trabalhadores ficaram gravemente feridos.

O episódio da CSN gera crise no governo e influencia as eleições municipais daquele ano. Candidatos de partidos de oposição, como PT e PDT, vencem em importantes cidades do país.

Já em dezembro, outra tragédia envolvendo luta social comove o país. No dia 22, o sindicalista e líder ecológico Chico Mendes é assassinado em sua casa, em Xapuri (AC). A atuação de Mendes em defesa tanto dos seringueiros como pela preservação da floresta amazônica ganhou projeção internacional e incomodou os fazendeiros do Acre. Os assassinos Darly e Darcy Alves da Silva (pai e filho) são ligados à União Democrática Ruralista (UDR).

Em Sorocaba – Em setembro de 1988, o sindicato dos metalúrgicos muda-se para sua sede própria, na rua Júlio Hanser, 140. A última prestação da área de 3.500 m2 e do prédio de 1050 m2, com três andares, foi paga em dezembro de 1991.

1989 – Ano das primeiras eleições diretas para presidente da República em 29 anos. Vinte e dois candidatos disputam o primeiro turno, em 15 de novembro. Luís Inácio Lula da Silva, do PT, e Fernando Collor de Mello, do PRN, vão para o segundo turno, realizado em 17 de dezembro. Collor é eleito por 35 milhões de brasileiros ou 50% do total de votos. Lula recebe 31 milhões de votos (44%). Apesar de disputar a presidência pelo obscuro PRN (Partido da Renovação Nacional), Collor não era o que se esforçava para parecer aos eleitores: um personagem novo na política. Ele já havia sido prefeito biônico (indicado pela ditadura militar) de Maceió, deputado federal eleito pelo PDS (antiga Arena) e governador de Alagoas pelo PMDB.

Três fatores são apontandos como determinantes para a derrota do petista: 1. o depoimento de Miriam Cordeiro, ex-namorada de Lula, no programa do PRN, onde ela acusou o candidato do PT de ter lhe proposto, anos antes, que abortasse uma filha que esperava do metalúrgico. Mais tarde se descobriu que Miriam foi paga pela equipe de Collor para dar o depoimento e que ela continuou recebendo “mesada” do PRN até anos depois da eleição. A opinião pública tomou conhecimento também, depois das eleições, que Lurian, a filha de Lula com Miriam, nunca havia sido rejeitada pelo pai, tendo sido inclusive mencionada pelo sindicalista em entrevistas anteriores. 2. A TV Globo editou trechos de um debate entre os candidatos ao segundo turno e levou ao ar, dois dias antes da eleição, os melhores momentos de Collor e os piores de Lula. Além dos trechos selecionados, o compacto do debate que foi ao ar no Jornal Nacional, da TV Globo, dedicou 3min.34seg. para Collor e 2min.22seg. para Lula. Uma vantagem de 1min.12seg. para o candidato do PRN; tempo bastante considerável em termos de televisão. 3. Membros da cúpula da polícia de São Paulo, então comandada por Luiz Antônio Fleury Filho, forçaram sequestradores do empresário Abílio Diniz a vestirem camisetas do PT ao serem presos, na véspera da votação. A prisão teve cobertura de toda a imprensa. Vários veículos de comunicação noticiaram com destaque, em geral por pressão dos donos desses veículos, o suposto envolvimento do PT no seqüestro.

Em Sorocaba – As divergências entre as correntes da CUT “Articulação” e “CUT pela Base” se tornaram mais evidentes entre os membros da diretoria do sindicato, criando dois grupos com propostas divergentes. Apesar dos impasses, a direção resolver tentar conciliar as diferenças e continuar unida para disputar as eleições nos dias 2, 3 e 4 de agosto. Não houve oposição. A chapa 1 foi eleita tendo como presidente Geraldo Titotto Filho; Hamilton Pereira, vice e Carlos Roberto de Gáspari, secretário geral. Bolinha resolveu não concorrer ao sindicato naquele ano, mas apoiou a chapa única. Entre os diretores eleitos havia simpatizantes do marxismo-lenninismo, membros da Pastoral Operária (PO) e independentes.

1990 – No dia 15 de março Collor toma posse como presidente. Abre-se uma nova fase vergonhosa para o país e cheia de novos sacrifícios para os trabalhadores. Já na posse, o presidente confisca o dinheiro de contas bancárias, investimentos e poupanças da população, muda a moeda de cruzado novo para cruzeiro e inicia uma política de abertura para produtos estrangeiros jamais vista no país. Para tentar neutralizar a CUT, Collor colabora na criação de uma nova central sindical, que lhe desse apoio: a Força Sindical. Para reforçar sua imagem de jovem, moderno e intelectual, o presidente investe pesado em marketing e encenações diante das câmeras. Exibe-se em corridas matinais, co-pilota aviões, anda de jet ski, corre em motos possantes (inclusive contrabandeadas), faz citações literárias, chama os carros nacionais de “carroças”, etc. Por longos meses, a imprensa e a opinião pública dedicaram intensa atenção ao exibicionismo e às demonstrações de vaidade de Collor.

Em Sorocaba a essa altura, além dos metalúrgicos, dos têxteis e dos condutores, também já estavam no campo da CUT em Sorocaba os Sindicatos dos Trabalhadores em Indústrias de Papel e Papelão e dos Trabalhadores em Indústrias Químicas, além das subsedes da Apeoesp (associação de professores do ensino oficial) e do Sindsaúde (servidores da saúde).

MUDANÇAS NO MUNDO

No início da década de 90, o Brasil havia mudado, assim como o mundo. Mesmo com todos os problemas, havíamos ao menos conquistado a democracia política, embora a democracia social estivesse longe de ser alcançada. Ao mesmo tempo, os conflitos nos países socialistas do leste europeu, a queda do muro de Berlim e a dissolução da União Soviética fizeram parte da esquerda brasileira repensar suas convicções, procurar novos conteúdos para seus discursos e elaborar novos programas de formação para explicar a história da sociedade aos trabalhadores.

Por outro lado, o capitalismo continuava a excluir mais e mais pessoas dos direitos básicos de cidadania. As grandes potências propunham um novo modelo de relações entre países: a globalização. Em pouco tempo se descobriu que a globalização era meramente comercial e muito mais vantajosa para as nações desenvolvidas. Os produtos dos países ricos adquirem facilidades para ser vendidos em todo o planeta. Os países subdesenvolvidos não conseguem produzir mercadorias competitivas para o mercado mundial. A qualidade de vida e os direitos sociais do primeiro mundo não entram no “pacote” do intercâmbio global, pois jamais se cogitou implementá-los nos países pobres.

O planeta começou a se dividir em blocos comerciais, como a União Européia e o Nafta, na América do Norte. Na América do Sul, as discussões sobre integração comercial da região vinham se desenvolvendo desde 1986, entre Brasil e Argentina. Em julho de 1990, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai assinam o tratado de Assunção, que propõe a criação de um mercado comum entre esses países (o Mercosul) à partir de 31 de dezembro de 1994.

Todos esses acontecimentos influenciaram os movimentos populares brasileiros, incluindo o sindicalismo. Os debates entre as correntes e tendências dentro da CUT se acirraram.

1992 – As denúncias de corrupção no governo Collor, noticiadas pela imprensa e investigadas por uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), levam cada vez mais pessoas às ruas para protestar contra o governo. As manifestações públicas têm como lema o “Fora Collor”. Vários setores da sociedade se unem nesse movimento, com destaque para os estudantes secundaristas, que se pintam de verde e amarelo para exigir ética na política e ficam conhecidos como “cara-pintadas”.

Em Sorocaba, o sindicato dos metalúrgicos liderou um ato na praça Coronel Fernando Prestes no dia 29 de setembro. Centenas de pessoas acompanharam juntas, em uma televisão instalada na praça, a votação do impeachment pela Câmara dos Deputados. Foram 441 votos a favor do afastamento de Collor, 38 contra, 23 ausências e uma abstenção. Em 29 de dezembro, certo de que a decisão dos deputados seria confirmada pelo Senado, Collor renuncia à presidência. Apesar dessa última tentativa de manobra do ex-presidente, o impeachment seria confirmado pelo Poder Legislativo, tornando Collor inelegível (impedido de se candidatar a cargos públicos) por oito anos.

Em Sorocaba – Em 1992, os conflitos ideológicos entre as correntes da CUT dentro da diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba atingem a um nível insustentável. A maioria dos dirigentes chega à conclusão que tentar manter a unidade seria adiar uma disputa inevitável, causando a estagnação da entidade enquanto durassem os embates internos. A solução foi formar duas chapas da CUT para concorrer às eleições nos dias 27, 28 e 29 de julho. A chapa 1, ligada à “Articulação”, foi liderada por Carlos Roberto de Gáspari. A chapa 2, defensora da “CUT pela Base”, teve como encabeçador Edson João Mora. Não houve outras chapas inscritas. Os metalúrgicos sindicalizados tiveram que decidir por qual tendência da CUT o sindicato seria dirigido. Foram apurados 6143 votos úteis. A chapa 1 venceu a chapa 2 por 571 votos de diferença.

Ainda em 92, o PT de Sorocaba escolhe um sindicalista metalúrgico para ser seu candidato à prefeitura do município. Hamilton Pereira assusta o tradicional poder local ao chegar ao segundo turno. A participação da militância, que saía às ruas em campanha para o petista, lembrou – guardadas as proporções – a empolgação das eleições para presidente de 1989. No segundo turno Hamilton recebeu 88.774 votos, perdendo por menos de sete mil votos para o candidato do PMDB, Paulo Mendes.

1993 – O ano começa com o vice de Collor, Itamar Franco, do PMDB, na presidência.

Em Sorocaba, Sindicato Cidadão – No dia 23 de janeiro é realizado, na sede do sindicato, o 3º Encontro dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região. O Encontro definiu a atuação do sindicato em dois eixos: a organização da base e o resgate da cidadania. Esse segundo eixo inclui a luta pela participação dos trabalhadores nos rumos da sociedade e a presença do sindicato em debates e ações que envolvam temas sociais, como o direito ao trabalho, à saúde, à moradia, à educação, à cultura, à informação, etc. Tem início assim uma nova meta de conduta da entidade: o Sindicato Cidadão.

Ainda em 1993, sindicato e empresa Cooper Tools chegam a um acordo para substituir a Cipa por uma Comissão de Condições de Trabalho, Saúde e Meio Ambiente. Como o próprio nome sugere, essa comissão tem atribuições bem mais amplas do que a Cipa, além de ser integrada somente por representantes dos trabalhadores, sem participação patronal. A nova comissão foi eleita em agosto, sendo a primeira desse gênero em uma empresa privada no país.

Em novembro, o sindicato inaugura o Espaço Cultural dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, na rua da Penha, 748. Hoje, o Espaço funciona na sede do sindicato, no bairro Lageado, e continua produzindo e apoiando as mais variadas formas de expressão cultural.

1994 – O movimento sindical inicia 94 denunciando as perdas que os trabalhadores da ativa e aposentados podem sofrer com a reforma constitucional. Em março, Itamar Franco implanta a URV (Unidade Real de Valor), uma espécie de moeda fictícia. A moeda oficial na época era o Cruzeiro Real. Cada URV valia um determinado número de cruzeiros reais, conforme o dia da conversão. Mercadorias e salários passaram a ter seu valor fixado em URV, embora os pagamentos fossem feitos em cruzeiros reais. O plano econômico foi comandado pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso.

Em maio, Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, metalúrgico da região do ABC, subtitui Jair Meneguelli na presidência da CUT Nacional.

A partir de 1º de julho entra em vigor o Plano Real. A moeda brasileira muda novamente de nome. Cada URV, mesmo com toda a inflação dos últimos meses embutida, passa a valer R$ 1,00 (um real). O câmbio do país também é mudado para que o valor do real passe a ser equivalente ao do dólar. Logo após o plano, Fernando Henrique deixa o cargo de ministro para se candidatar à presidência da República.

Fernando Henrique Cardoso, ou FHC, é eleito presidente no 1º turno da votação.

Em Sorocaba – Em abril de 1994, durante a campanha salarial, o Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba lidera greves em várias fábricas para obter reajustes. Na maioria das empresas os metalúrgicos conquistam um reajuste de 19% em URV. Em alguns casos por acordos estaduais e, em outros, através de acordos por fábrica. Os acordos dos metalúrgicos foram considerados entre os melhores do país na época, pois a maior parte das categorias vinha obtendo aumentos somente em cruzeiros reais, causando perdas quase imediatas no valor de compra dos salários.

Em dezembro, o Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba lança, junto com outras 15 entidades, a 1ª edição da campanha Natal Sem Fome na cidade, arrecadando 28 toneladas de alimentos para serem distribuídos às famílias carentes. A fim de politizar o tema, o subtítulo da campanha local foi “menos miséria, mais empregos”. A iniciativa em Sorocaba é inspirada na Ação da Cidadania, do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.

No final do ano, o metalúrgico e sindicalista sorocabano Hamilton Pereira, do PT, é eleito deputado estadual pela primeira vez.

1995 – No início desse ano, 32 ex-funcionários da empresa Bestetti, que havia falido pouco antes, alugam um galpão na avenida Pereira Inácio em Sorocaba e inauguram uma fábrica de macacos hidráulicos chamada Hidro-Phoenix (em alusão ao pássaro mitológico que renasce das cinzas). Surge assim a primeira empresa de autogestão (gerenciada pelos próprios funcionários) da região de Sorocaba. Para abrir a nova empresa, os pioneiros da Hidro-Phoenix utilizaram recursos financeiros e ferramentas que receberam da Bestetti, como pagamento de dívidas trabalhistas. Em agosto de 97, já consolidada no mercado, a Hidro-Phoenix muda-se para Votorantim, passando a funcionar em instalações próprias. O terreno foi doado pela prefeitura daquele município e a construção do prédio financiada pelo BNDES. Todo o processo que culminou com a autogestão, incluindo vários meses de participação dos trabalhadores na administração da Bestetti, em 94, teve apoio do Sindicato dos Metalúrgicos.

Preocupado com as tentativas do governo FHC de reduzir direitos previdenciários, o sindicato dos metalúrgicos incentiva os aposentados da categoria a criar uma entidade própria para organizá-los e representá-los. Em 31 de março de 95 é fundada a Associação dos Metalúrgicos Aposentados de Sorocaba e Região (Amaso).

Movimento pela Qualificação Profissional

Ao longo dos primeiros meses de 95, vários setores da sociedade em Sorocaba atendem aos convites feitos pelo movimento sindical para discutir “a importância da qualificação profissional no combate ao desemprego”. Essas discussões dão origem, em setembro, ao Movimento pela Qualificação do Trabalhador (MQT), com participação de sindicatos, empresários, igrejas, universidades, da Ordem dos Advogados do Brasil e do poder público, entre outros. Essas entidades se uniram para estudar o problema do desemprego na região e solicitar verbas ao Estado para cursos de qualificação profissional. Na época da criação do movimento em Sorocaba, as relações existentes entre o ensino ao adulto e o mercado de trabalho estavam bastante esquecidas no país, não tendo a mesma proporção que adquiriu nos últimos anos.

Ainda em setembro de 95, o MQT divulga uma pesquisa sobre o perfil do trabalhador sorocabano, feita no mês anterior pelo instituto Ipeso, como colaboração ao movimento. Descobriu-se que havia 22.456 desempregados maiores de 18 anos em Sorocaba. Entre esses, 3,4% eram analfabetos, 41,4% não tinham o 1º grau completo, 44,8% não concluiram o 2º grau. Quanto à qualificação profissional, 51,7% dos entrevistados afirmaram não possuir nenhum curso nesse sentido. A grande maioria, 72,4%, dizia possuir pelo menos um ofício, mas aprendido somente “na prática”.

1996 – Em março, o sindicato dos metalúrgicos de Sorocaba e Região lança uma campanha pela auto-sustentação da entidade. O objetivo é tornar o sindicato um dos primeiros do país a conseguir se manter financeiramente apenas com as contribuições dos associados. A campanha inclui a devolução do imposto sindical, criado por Getúlio Vargas na década de 40 e descontado sempre em março, aos metalúrgicos sindicalizados. Em assembléia, a categoria decide que o sindicato deve investir o dinheiro do imposto na compra de carros zero quilômetro para serem sorteados mensalmente entre os associados. A campanha parece ter funcionado. Em agosto de 1995 o sindicato tinha 5.616 sócios, sendo 3.907 pagantes. Em agosto 1997 esse número havia saltado para 10.863 sócios (8.641 pagantes) entre os 19 mil metalúrgicos da região. A parcela não-pagante dos quadros da entidade inclui sócios aposentados, associados afastados do trabalho por doença ou acidente e metalúrgicos sindicalizados em período de carência pós-demissão (6 meses de carência).

Nas eleições de outubro, o metalúrgico e sindicalista Antônio Arnaud Pereira, o Arnô do PT, foi eleito vereador em Sorocaba.

Ainda em 1996, metalúrgicos de várias empresas conquistam pela primeira vez o pagamento de Participação nos Lucros e Resultados (PLR), então uma novidade no Brasil.

Sindicato-escola em Sorocaba

Como resultado da atenção que o sindicato dedicou aos debates sobre capacitação profissional, entre novembro e dezembro de 1996, o sindicato passa a abrigar dois cursos destinados a trabalhadores: um supletivo de 5ª a 8ª série feito em convênio com a prefeitura de Sorocaba e o Programa Integrar, de ensino fundamental e qualificação para o trabalho. A metodologia do Integrar foi desenvolvida pela PUC, UFRJ e outras universidades, sob a coordenação da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM). As verbas para o curso vêm do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).

No ano seguinte, a entidade passa a abrigar também cursos de básicos de informática, com carga horária média de 100 horas-aula.

O Programa Integrar é destinado a desempregados. O supletivo municipal destina 2/3 das vagas para sócios do sindicato e o restante para a comunidade. Os cursos de informática seguem a mesma distribuição de vagas que o supletivo.

Até o final de 1999, cerca de 1500 pessoas já haviam recebido certificados de conclusão de cursos oferecidos pelo sindicato, sendo 155 pelo Programa Integrar, 226 pelo supletivo municipal, 700 pelo curso de informática básica e o restante em cursos profissionalizantes realizados em parceria com escolas técnicas da cidade.

Fontes:

– Cem Anos de Luta da Classe Operária no Brasil – 1880/1980, Vito Giannotti

– Imagens da Luta – 1905/1985, Sind. Metalúrgicos do ABC

– História da Classe Operária no Brasil (cadernos 2, 3 e 4), Ação Católica Operária

– As Relações Igreja-Estado no Brasil, vol. 3; CPV

– Memórias do Trabalho, CNM/CUT

– Os Carbonários, Alfredo Sirkis

– Batismo de Sangue, Frei Betto

– Chatô – O Rei do Brasil, Fernando Morais

– De Angra a Aramar, CEDI, Desep-CUT, Nemi, Sind. Metal. Sorocaba

– Notícias do Planalto, Mario Sérgio Conti

– A Enxada que Plantou uma Siderúrgica

– O Pensamento Industrial no Brasil – Edgard Carone

– A Cidade e As Fábricas – O Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região, Projeto Memória e História Local, EEPG Humberto de Campos, Sorocaba. Coord. Geraldo Titotto Filho

– Guia de Convênios e Serviços aos Associados, Sind. Metalúrgicos de Sorocaba

– Um ano Depois – 1984, Sind. Metalúrgicos Sorocaba

– Anarquismo e Anarco-sindicalismo, Giuseppina Sferra

– Olga, Fernando Morais

– Cruzeiro do Sul, edição especial pelos 324 anos de Sorocaba, 1979

www.torturanuncamais.org.br , site do movimento Tortura Nunca Mais

– Help ! Sistema de Consulta, História do Brasil, jornal Estadão

– Coleção 100 anos de República

– Liberalismo e Sindicato no Brasil – Luiz Werneck Vianna

– O Brasil Republicano – volumes 9 e 10, sob direção de Boris Fausto

– Extra – As primeiras páginas da história de Sorocaba

– Arquivo Folha Metalúrgica, órgão informativo do Sind. dos Metal. Sorocaba

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